Por Tébis Oliveira | Ilustração Heder Oliveira
Mesmo atarefado com os preparativos para a EXPOSIBRAM, que ocorreria dali a duas semanas em Belém (PA), o gerente executivo do IBRAM Amazônia, Ronaldo Jorge da Silva Lima, concedeu a In The Mine esta entrevista exclusiva. A calma e tranquilidade com que responde às questões talvez advenham da formação como geólogo que o ensinou “que o tempo da natureza tem uma dimensão muito maior que o tempo do homem”.
Ou de sua experiência no setor público, onde atuou por mais de 15 anos como gerente de Análise de Projetos Minerários da Secretaria de Meio Ambiente (SEMA) do Pará. Setor esse que deve ganhar agilidade, na opinião de Lima, o que somente será possível quando entender “o problema do setor produtivo no timing de seu negócio, que não pode ser prejudicado pela burocracia dos processos”. Mas que, afirma, tem que manter todos os cuidados porque deve prestar contas à sociedade. Algo que, em contrapartida, também deve ser entendido pelo setor produtivo.
Essas diferenças, diz o gerente, precisam ser compatibilizadas. O que só acontece com muito diálogo. E é o que ele tem feito ao conversar com secretarias de governo, mineradoras e comunidades de municípios mineradores. Ativamente e insistindo sempre que a mineração se modernizou, atua com sustentabilidade e responsabilidade social e tem muito – inclusive, se comparada a outras atividades econômicas – a oferecer ao desenvolvimento regional. “Nosso trabalho fundamental é servir de interlocutor, não de um projeto ou de uma empresa, mas de todo o setor. Queremos nos fazer cada vez mais presentes em todas as discussões que possam levar ao fortalecimento da mineração”, assegura.
ITM: Qual tem sido a atuação do IBRAM Amazônia junto ao poder público?
Lima: Temos participado de várias discussões, em especial com as secretarias de Indústria, Comércio e Mineração (SEICOM) e de Meio Ambiente (SEMA) do Pará (PA), que têm influência direta no setor de mineração. Na SEICOM, colaboramos com a elaboração do Plano Estadual de Mineração, lançado em abril passado. Para isso, realizamos palestras em seis das dez oficinas promovidas pelo órgão, entre 2013 e o início de 2014, abordando temas diversos do setor como tributos, royalties, ordenamento da pequena mineração e pesquisa mineral, entre outros.
ITM: E com relação a SEMA?
Lima: Com a SEMA estamos empenhados em simplificar o processo de licenciamento ambiental, cujo grau de dificuldade não é uma particularidade da Amazônia, mas de todo o Brasil. Buscamos demonstrar à secretaria e ao próprio IBAMA que a atividade de mineração é bastante singular e não pode ter o mesmo tratamento dado a atividades menos complexas. O conhecimento das singularidades do setor trará, com certeza, maior agilidade aos processos de licenciamento.
ITM: E como essa discussão tem avançado?
Lima: Já propusemos a elaboração conjunta com esses órgãos de um manual de procedimentos para o licenciamento ambiental para mineração. Também estamos propondo um cadastro ambiental rural específico para o setor. Outra discussão é sobre a reserva legal. Na Amazônia as mineradoras têm que destinar 80% e, em alguns casos 50%, como área de reserva legal. Como geralmente essa área está localizada nas concessões para exploração, o direito minerário acaba não sendo mais um direito, já que a reserva legal conflita com o direito de exploração.
ITM: Vocês têm atuado também junto às comunidades?
Lima: Sim, através de um programa da SEICOM voltado ao desenvolvimento de municípios mineradores. Já visitamos Parauapebas, Canaã dos Carajás, Redenção, Juruti, Itaituba e Santarém, entre outros, realizando palestras para mostrar que a mineração se modernizou, está mais próxima das comunidades, atua com sustentabilidade e responsabilidade social e está aberta ao diálogo. Enfim, que tem muito a oferecer ao desenvolvimento regional e, se comparada a outros setores, é a atividade que mais contribui para esse desenvolvimento.
ITM: O IBRAM Amazônia também está em um projeto com a Secretaria da Educação…
Lima: É uma parceria recente, fechada em 10 de outubro último, com nossa adesão ao projeto “Pacto pela Educação”. Nosso compromisso é ajudar na interlocução entre as mineradoras e o governo do estado, contribuindo para a melhoria das condições de ensino em todo Pará. Algo que a mineração já vem fazendo, aliás. Tanto que os municípios mineradores apresentam melhor Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) que municípios onde não há operação mineral.
ITM: Quais são os objetivos do Consórcio Mineral para a Sustentabilidade, lançado pelo IBRAM Amazônia?
Lima: Um dos objetivos é produzir dados referenciais inéditos sobre a atuação socioambiental do setor mineral na região Amazônica, para compor os cadernos temáticos do programa. Até junho de 2015, pretendemos disponibilizar esses cadernos para dois segmentos – alumínio e caulim. Com a adesão de mais empresas, ampliaremos para outros segmentos, como os de cobre, ferro e níquel. São dados de que as empresas já dispõem, mas que precisam ser consolidados e sistematizados para serem apresentados à sociedade. O que é uma das missões do IBRAM.
ITM: Quais empresas estão participando desse projeto?
Lima: Inicialmente, a proposta era voltada às principais empresas de mineração que atuam na Amazônia para, depois, ir agregando empresas menores. Como uma dessas mineradoras não nos deu seu aceite ainda, iniciamos o projeto com as empresas da indústria de alumínio. Entre elas, a Mineração Rio do Norte (MRN), a Norsk Hydro e a Votorantim. Também já estamos trabalhando com empresas do segmento de caulim, como a Imerys.
ITM: Qual é sua análise, hoje, das perspectivas para a mineração na Amazônia?
Lima: Apesar da crise econômica mundial, nossa expectativa se mantém bastante positiva com relação aos investimentos em mineração. A projeção mais recente feita pelo IBRAM prevê um aporte de cerca de R$ 63,5 bilhões na Amazônia entre 2012 e 2016. Contamos com vários projetos em curso, que aguardam a licença ambiental ou a licença de instalação.
ITM: O senhor pode citar alguns desses projetos?
Lima: Um é o da Horizonte Minerals, de níquel, em Conceição do Araguaia, com audiência pública agendada para dezembro. Outro é o da Avanco, de ouro e cobre, em Parauapebas, que finaliza o EIA-RIMA para produzir em escala industrial. Há também o da Mineração Caraíba, de cobre, em Tucumã, que está em vias de obter a Licença de Instalação. Entre os projetos de ouro, temos o da Belo Sun Mining, em Volta Grande do Xingu, com Licença Prévia, da Serabi Mineração, em Itaituba, em licenciamento, o Projeto Cachoeira, da Brasil Resources, em Cachoeira do Piriá, com audiência pública agendada para o início de 2015 e, ainda em Itaituba, o Projeto Tocantinzinho, da Brazauro Resources, na fase de Licença de Instalação.
ITM: Além, é claro, dos projetos de fosfato, níquel e ferro…
Lima: Sim. Um destaque entre os projetos de fosfato é o da MbAC, em São Félix do Xingu, que já teve audiência pública e está em licenciamento ambiental, assim como o da Fosfatar Mineração, em Bonito. Outro grande empreendimento é o Projeto Jacaré, de níquel, da Anglo American, em São Félix do Xingu, que deve apresentar em breve o EIA-RIMA. Além do S11D da Vale, em Canaã dos Carajás, de exploração de ferro com investimento da ordem de US$ 20 bilhões, sem contar as ampliações da Alcoa (bauxita/alumina) e da Imerys (caulim).
ITM: Em sua opinião, a demora na aprovação do novo Marco Regulatório da Mineração adiou ou desestimulou investimentos do setor na região?
Lima: Eu não diria que foi só a questão do MRM. Acho que o maior responsável pela retração do setor é o baixo valor das commodities. Estamos passando pelo já conhecido ciclo da mineração, que ocorre a cada 30/35 anos: preço em alta com maior investimento em prospecção; aumento da oferta com redução de preços, prospecção retraída e até fechamento de minas; nova redução de oferta com retorno à alta de preços e, assim, o ciclo se renova. Estamos no momento da redução de preços e retração na prospecção. Claro que a questão do MRM criou incertezas que também contribuíram para essa situação.
ITM: O projeto do novo MRM e a suspensão dos alvarás de pesquisa mineral pelo MME também provocaram a saída de várias junior companies da região.
Lima: Sem dúvida, mas essa conjuntura esteve aliada ao baixo valor das commodities. Lembro que, em 1993, todas as grandes mineradoras de ouro do mundo estavam prospectando na região do Tapajós e se retiraram com a retração de preços. É claro que a instabilidade jurídica provocada pelo projeto do novo MRM gera dúvidas entre os investidores. E que a suspensão dos alvarás de pesquisa mineral contribuiu muito para agravar esse quadro. Só não houve uma reação maior das empresas porque os preços estão em baixa. Se estivessem atrativos, a discussão seria bem mais acalorada.
ITM: Um dos maiores gargalos desta região é a falta de infraestrutura logística. Como o IBRAM Amazônia tem atuado para minorar esse problema?
Lima: O Custo Amazônia e, por extensão, o Custo Brasil, tem que diminuir e a questão da infraestrutura é fundamental nesse processo devido ao seu impacto direto no custo final dos produtos. Nossa estratégia, no IBRAM Amazônia, é de somar esforços com outros setores, principalmente o agrícola, que sofre do mesmo problema. A partir dessa soma de esforços, contamos com a parceria fundamental da FIEPA (Federação das Indústrias do Estado do Pará), que pode fortalecer nossas demandas junto ao governo.
ITM: Como o senhor avalia a sustentabilidade das operações minerais diante das condicionantes ambientais e sociais diversas da região?
Lima: Houve uma evolução muito grande. Antes, muitas medidas socioambientais eram impostas no licenciamento ambiental. Hoje, as próprias mineradoras apresentam propostas para conciliar a exploração mineral com a preservação ambiental e a responsabilidade social. O projeto S11D, da Vale, é um exemplo. A adoção da tecnologia truckless e do tratamento do minério a seco representam um avanço tecnológico muito importante na redução dos impactos ambientais da exploração mineral. Outra conquista representativa da internalização da sustentabilidade na mineração é a responsabilidade social, através do maior compromisso com as comunidades localizadas nas áreas de influência dos projetos.
ITM: Quando essas mudanças começaram a ocorrer?
Lima: Lembro que, no final dos anos 1990, o projeto Sossego, da Vale, foi um marco na área de licenciamento ambiental. Na SEMA, onde eu estava então, conseguimos que ele integrasse um plano de desenvolvimento sustentável para Canaã dos Carajás, em lugar de criar um núcleo isolado para os trabalhadores como em Carajás. Foi esse projeto que deu início a um diálogo efetivo entre o poder público e o setor produtivo na condução do licenciamento ambiental. Foi a quebra de um paradigma fazendo com que, hoje, o trato da sustentabilidade e da responsabilidade ambiental nas empresas seja bastante priorizado.
ITM: Como sua experiência no setor público tem contribuído para o exercício de seu atual cargo?
Lima: Eu tive o privilégio de atuar no setor público e no privado. Todo profissional deveria ter essa oportunidade para entender o objetivo de cada um. Por exemplo, o setor público deve entender o setor produtivo no timing de seu negócio, que não pode ser prejudicado pela burocracia dos processos. Como já falamos, devido à flutuação dos valores das commodities, um projeto que é atrativo hoje pode não sê-lo amanhã. Por outro lado, o setor produtivo também tem que entender a responsabilidade do setor público na prestação de contas à sociedade. Todo o cuidado, todo o critério nele exercido, deve-se a essa responsabilidade. Ao compatibilizar essas diferenças podemos ter uma agilidade maior que venha a beneficiar toda a sociedade.
ITM: A formação em geologia também ajuda no trato com a mineração?
Lima: A geologia nos dá uma visão muito abrangente. Quando tratamos de processos geológicos estamos falando em milhões de anos. Aprendemos que o tempo da natureza tem uma dimensão muito maior que o tempo do homem. Então, percebemos a importância do ambiente, o que nos direciona muito para a questão humana. Quando relacionamos a natureza com a interação do homem, ganhamos uma acessibilidade maior às questões sociais e ambientais, que servem de base para uma sensibilidade política contribuindo para avanços e transformações.