Por Gabriela Nunes | Ilustração Heder Oliveira
Após ter trabalho no Canadá, na China e em vários estados do Brasil, Alexandre Gomes agora se encontra em Belo Horizonte (MG) – isso quando não está em reuniões ou visitando de perto algum de seus projetos. Com 55 anos, hoje é o Diretor de Tecnologia da Votorantim Metais (VM).
Sempre envolvido com mineração, Gomes já passou por empresas como a Alcan e Anglo American. Dentro da VM, há dois anos e meio, começou fazendo parte da equipe de gestão da unidade Zinco Brasil e depois foi para a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA). Hoje, tem papel importante na área de Inovações Tecnológicas, com a qual colaborou e que deu origem a uma diretoria voltada especificamente para isso, até então inexistente.
O grande foco dos projetos que desenvolve como diretor é criar soluções tecnológicas que tenham um impacto menor no meio ambiente e que reduzam custos desnecessários para a empresa. Por exemplo, a realização de estudos para duplicar, triplicar e talvez até perenizar barragens. Além disso, existem diversos projetos de eficiência energética, junto com a redução da emissão de gases no efeito estufa. Outro projeto que só foi possível graças ao trabalho da equipe da Diretoria de Tecnologia, foi a redução de cerca de 30% no uso da água na unidade de Metalurgia em Três Marias (MG), uma conquista importante da planta, que fica próxima ao Rio São Francisco.
Outro programa bem sucedido, de que se orgulha Gomes, é o “Resíduo Zero”, implantado na Unidade Morro Agudo, em Paracatu (MG), que transforma os resíduos despejados em novos insumos – mostrado em detalhes em edição anterior da revista In The Mine. O diretor está convencido de que realmente é melhor investir mais na fase do estudo, enquanto o projeto ainda não está funcionando, do que mais para frente ao notar pormenores que poderiam ser alterados. A premiação da Votorantim Metais na categoria “empresa mais sustentável do setor de Mineração”, do Guia Exame de Sustentabilidade 2013, segundo ele, veio coroar este trabalho inovador que a empresa vem fazendo.
ITM: Em que momento a VM estruturou uma área própria para pensar e desenvolver soluções tecnológicas?
Gomes: Eu percebi que tinha muita coisa em comum entre o zinco e o alumínio, por exemplo, que a gente não estava otimizando, não havia uma sinergia – apesar de ser a mesma empresa. A partir daí surgiu a ideia de criar uma Diretoria de Tecnologia, que fizesse com que as pessoas trabalhassem em conjunto, tendo projetos em conjunto. O primeiro passo foi juntar as equipes e estabelecer uma visão da empresa. Essa visão é como se fosse a nossa Bíblia: todos os dias, temos que ver o quanto caminhamos para transformar a VM em uma referência em sustentabilidade. Temos vários objetivos: alcançar resíduo zero e reciclagem de efluentes até 2020, flexibilizar o uso de matérias-primas, incluindo matriz energética, buscar tecnologias que permitam viabilizar novas jazidas e estender a vida útil das atuais instalações. Em suma: estar na fronteira tecnológica e “liderar” ao invés de “seguir”.
ITM: Como essa área foi estruturada internamente?
Gomes: Essa área existe há um ano e meio ainda. Nós percebemos que sozinho seria difícil, o zinco só com o zinco, o alumínio só com alumínio. Então, nessa estrutura de Inovação Tecnológica, nós reunimos as pessoas mais sêniores, em termos de conhecimento. Ao todo são 80 pessoas. Pegamos uma equipe de notáveis que estava espalhada pelas plantas, mas não tinha a meta específica que nós queríamos, e organizamos.
ITM: Quais sãos os principais desafios enfrentados para implantar novas tecnologias?
Gomes: Cada planta é um desafio diferente. Mas eu acho que a principal dificuldade encontrada é garantir o acesso ao conhecimento da tecnologia que tem que ser aplicada. Uma vez um engenheiro nosso foi fazer uma visita na China e descobriu que lá tinha a tecnologia que a gente precisava em um caso específico. Então, muitas vezes, temos que sair pelo mundo a fora, temos que ir atrás. O acesso ao conhecimento tem que ser uma busca permanente.
ITM: Qual tem sido a postura da VM para priorizar essa filosofia no dia a dia?
Gomes: A gente tem parcerias com universidades e com institutos de pesquisa. Assim, nós conseguimos aproveitar o conhecimento da academia e transformá-lo em um conhecimento que pode ser aplicado. Algumas empresas têm centro de pesquisa, nós não. Nossa estratégia é de inovação aberta, ou seja, ter contato com todas as instituições e não necessariamente desenvolver internamente. Todos os nossos projetos, em hidrometalurgia, concentração, tratamento de efluentes, têm que estar conectados com as maiores fontes mundiais de conhecimento.
ITM: Mas há um trabalho de desenvolvimento interno?
Gomes: Não tem como ter uma equipe que sabe tudo, aí não seria inovação aberta. Tem que ter um equilíbrio entre recurso interno e externo. Procuramos desenvolver tecnologia com alguém que tem mais conhecimento acumulado, assim a gente não perde tempo. Entre os contratos que nós temos, por exemplo, estão a USP (Universidade de São Paulo), UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos), UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto), entre outras, cada uma com uma área de conhecimento específica.
ITM: A VM disponibiliza essas soluções para outras empresas no Brasil?
Gomes: Ainda não, mas a priori a gente não é fechado em relação a isso. Não é nosso foco. Hoje, nós estamos preocupados em reduzir nossos custos e alcançar o resíduo zero. Se a empresa começar a se envolver com venda de tecnologia, vai precisa de uma área específica para isso. Talvez isso possa acontecer algum dia.
ITM: E como esse conhecimento é disseminado dentro da própria VM?
Gomes: Nós adotamos um sistema chamado “Células de Inteligência”. Muitas vezes você não tem o conhecimento de uma tecnologia que está sendo desenvolvida do outro lado do mundo. E com essa célula, todos que viajam, visitam empresas que possuem inovações e frequentam congressos internacionais, têm que colocar a informação na intranet. A gente começou apenas como “Célula de Tecnologia de Níquel”, mas deu tão certo que o pessoal percebeu que precisava ir além, não era só sobre a tecnologia. Hoje todo mundo participa, do lugar onde estiver, a área de tecnologia, produção, suprimento, engenharia, todo mundo.
ITM: Na concepção da VM, o que é o conceito de inovação?
Gomes: Para nós, inovação é ter uma ideia que se transforme em dinheiro novo para a empresa, um dinheiro que ela não teria se não tivesse aquele projeto. O grande exemplo disso é o próprio Resíduo Zero, que focou na inovação da tecnologia do beneficiamento. Hoje, um resíduo gerado em nosso processo – o Zincal 200 – é um produto. Então, o que antes era um passivo ambiental, com um gasto que tinha para manutenção, hoje gente conseguimos transformar em uma oportunidade de receita nova para a empresa.
ITM: Quais os tipos de processos de inovação que a VM desenvolve?
Gomes: Existem projetos incrementais e transformacionais. Os incrementais são coisas que precisam ser melhoradas, como reduzir o custo. Agora os transformacionais, são como o “Resíduo Zero”, na Unidade de Morro Agudo em Paracatu (MG), em que um resíduo virou um produto, até mais caro. Antes a gente o chamava de Pó Calcário Agrícola (PCA), por ser utilizado na correção da acidez do solo. Mas ele tem uma qualidade tão boa que batizamos de Zincal 200.
ITM: O senhor poderia citar outros exemplos de novas tecnologias aplicadas ao processo?
Gomes: A tecnologia que a gente tem na Metalurgia em Três Marias, é uma patente que a gente desenvolveu, são os únicos smelters no mundo que podem receber silicatado e sulfetado de zinco. É um belo exemplo de desenvolvimento de tecnologia que virou exclusivo único no mundo. Hoje temos uma produção estimada em 183.000 t Zn contido. Como existem poucos silicatados no mundo, a equipe desenvolveu um tratamento específico com autoclaves para o silicatado, em razão do alto teor de magnésio, evitando assim que o processo seja contaminado.
ITM: Tem alguma unidade que já atingiu o nível de excelência dentro dos objetivos da diretoria?
Gomes: A unidade de Morro Agudo, pois é uma das que já fechou o processo. É uma planta pequena que já atingiu a meta de “Resíduo Zero”. Mas um exemplo encoraja o outro. A gente nunca acha que não tem mais nada para mexer. Por exemplo, agora mesmo nós estamos fazendo novas tentativas para levar o resíduo de outras unidades pra lá, para ver se conseguimos gerar um novo produto. Em Vazante (MG), nós inauguramos no final do ano passado a recuperação de prata, que antes era descartada pela barragem. É claro que foi um projeto complexo, não é simples. Precisou ter o momento certo e desenvolver a tecnologia adequada. Então, nunca estará totalmente redondo.
ITM: E há também projetos que visam diretamente a redução nos custos de produção?
Gomes: Estar no primeiro quartil da curva de custos é um dos nossos principais objetivos, por isso há uma gama de projetos que visam a contínua redução de custos. E grande parte dos projetos alia o meio ambiente com a redução de custos. Para isso, a equipe vem buscando oportunidades em todos os negócios, para que a gente possa usar o resíduo de um como o produto de outro. Por exemplo, o alucoque, que é um resíduo que pode ser insumo para geração de energia, está sendo testado em Niquelândia (GO) para reduzir esse custo, que é um dos maiores para as empresas.
ITM: Em média, qual tem sido o investimento anual da empresa em inovações tecnológicas?
Gomes: Esse ano foi o primeiro ano que fizemos um orçamento. As ideias foram aparecendo esse ano, mas ainda estamos fazendo estudos. Ao total, em 2013 teremos investido R$ 25 milhões em estudos de inovação. Esse valor é aplicado em viagens, contratos com universidades e institutos e condições para estudo.
ITM: Qual sua avaliação da contribuição governamental ao estudo e desenvolvimento de projetos de inovação tecnológica?
Gomes: Eu acho que o governo quer contribuir, mas não tem demanda. A VM, por exemplo, está quase conseguindo o financiamento da FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos). Se aprovado, teremos uma verba de até 3,5% ao ano, com três anos de carência. Além disso, ainda temos como fazer uma recuperação de custos com inovação por meio da Lei do Bem, que permite que você desconte no imposto de renda todas as despesas com tecnologia, inclusive salário. Mas aí nesse caso você tem que ter lucro. Tem também a EMBRAPII (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial), que funciona como uma organização que incentiva a realização de projetos empresarias de pesquisa, desenvolvimento e inovação, e banca metade dos custos. O Brasil tem os mecanismos de incentivo para desenvolver a tecnologia, mas acho que as empresas não têm o conhecimento de tal política.
(Outubro/Novembro 2013)