O volume total captado pelas operações Vale em 2022 foi de 397 Mm³. Desse montante, foram 137 Mm³ para fins operacionais (112 Mm³ utilizados e 25 Mm³ armazenados para uso futuro); 113 Mm³ disponibilizados para terceiros (abastecimento de comunidades próximas às operações da empresa, por exemplo); 146 Mm³ sem uso e devolvidos ao meio ambiente; e 1 Mm³ para fins não operacionais (reparação, pesquisa mineral, minas paralisadas e prédios administrativos). No mesmo ano foram reutilizados 507 Mm³.
Com metas globais de sustentabilidade alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030, da Organização das Nações Unidas (ONU), e às diretrizes do Conselho Internacional de Mineração e Metais (ICMM), a Vale iniciou, em 2018, o cumprimento de sua Meta Água 2030. O objetivo de reduzir em 10% o uso de água doce em relação ao ano de 2017 foi alcançado em 2021, nove anos antes do prazo estabelecido.
Para 2023, diz David Veiga Soares, analista especialista em Recursos Hídricos da mineradora, a Meta Água inicial será atualizada, levando em conta todas as bacias hidrográficas onde a empresa atua e estipulando objetivos próprios para cada um dos quatro pilares do Plano Estratégico da Gestão Responsável dos Recursos Hídricos e Efluentes Vale: Governança, Monitoramento, Engajamento e Riscos. “Vamos focar nossos esforços para reduzir mais 7% do nosso uso específico até 2030, considerando metas mais significativas para unidades locacionais em regiões com nível de estresse hídrico alto ou crítico”, explica Soares.
A definição do nível de estresse hídrico considera o indicador 6.4.2 da ONU, cuja metodologia se baseia em quatro variáveis – Quantidade (disponibilidade de água na bacia hidrográfica); Qualidade (qualidade da água disponível ao uso pretendido); Acessibilidade (disponibilidade de água para os usuários); e Fluxo Ecológico (vazão mínima para manutenção da vida aquática). O indicador reflete a proporção das retiradas de água doce em relação ao total dos recursos de água doce disponíveis. Soares diz que análise realizada no período de 2014 a 2021, identificou cinco operações da Vale no Brasil em que as bacias hidrográficas apresentaram níveis de estresse hídrico alto (75 a 100%) ou crítico (maior que 100%) – quatro delas em Minas Gerais e uma no Pará.
Outros planos de redução do uso de água deverão ser iniciados em regiões de operação da empresa com estresse hídrico médio ou baixo, em 2024, e em regiões sem estresse hídrico, em 2025, também com prazo de alcance das metas em 2030.
Indicadores e fontes
Em 2022, apesar do aumento da produção da empresa, houve diminuição do volume de água captado para fins produtivos, enquanto a taxa de reutilização se manteve acima de 80%, repetindo os indicadores registrados em 2020 e 2021. Em contrapartida, explica Soares, aumentou o volume de água captada e disponibilizada para terceiros, devido à conclusão das obras de captação, tratamento e distribuição para as comunidades afetadas pela ruptura da barragem de Brumadinho (MG). Segundo ele, ainda, também houve aumento do volume de água captada sem uso e devolvida ao meio ambiente, cujo excedente foi resultado do período chuvoso de 2021 e 2022 (Gráfico 1).
Fonte: Vale
Grande parte da demanda de água da Vale, em 2022, equivalente a 83% do total, foi atendida pelo sistema de recirculação, captação de água de chuva e dessalinização. Dessa forma, as principais fontes de captação são as águas superficiais: captação nos reservatórios das barragens, aproveitamento de água de chuva e captação em rios. Também há captação de águas subterrâneas, por meio dos poços tubulares e efluentes tratados, para usos menos nobres.
Os cuidados envolvidos no processo de captação dependem da qualidade e do uso pretendido para a água. Soares diz que, para usos mais nobres, como para consumo humano, o tratamento deve garantir padrões de potabilidade, enquanto para usos industriais, o nível de qualidade exigido varia conforme a área usuária, sempre preservando a saúde dos profissionais envolvidos na atividade, sem causar danos aos equipamentos e sem prejudicar a performance de produção. “Para cada unidade operacional é dimensionada uma rede de monitoramento, considerando número de pontos, parâmetros, frequência, tipo de instrumento e forma de medição. Para a medição da vazão ou volume de água, por exemplo, são utilizados medidores eletromagnéticos e ultrassônicos, entre outros”, detalha o analista.
No caso da recirculação são previstos dois tipos de reutilização. O primeiro trata da água reciclada, que foi utilizada em uma atividade operacional, recuperada e submetida a um tratamento primário ou avançado, conforme o uso pretendido, para ser utilizada novamente em uma atividade operacional. O outro tipo é o reuso, que ocorre quando a água utilizada em uma atividade operacional é recuperada e novamente utilizada em uma atividade operacional, sem que precise passar pela estação de tratamento.
A relação entre consumo, captação e reuso depende de uma análise integrada desses indicadores, pois está sujeita a algumas condicionantes. “Como exemplo, temos o Complexo S11D Eliezer Batista, no Pará, que possui taxa de reuso baixa, mas de maior eficiência que a de outras operações por ter menor intensidade hídrica – razão entre o volume de água utilizado e o produto gerado por ela”, justifica Soares.
Projeto piloto
A Vale tem otimizado seu uso e descarte de água através da implementação de projetos de reuso e recirculação em suas unidades operacionais. As práticas aumentam a disponibilidade e a qualidade dos recursos hídricos nas bacias hidrográficas onde a empresa atua. Além disso, utilizando sistemas de controle e tratamento para drenagem pluvial, água de processo e efluentes, a empresa pode considerar fontes alternativas de abastecimento viáveis. Uma dessas fontes alternativas, em unidades operacionais próximas às cidades, são os efluentes sanitários das Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs).
Essa possibilidade foi objeto de um projeto piloto preliminar realizado em 2022, para avaliar a viabilidade técnica e financeira da substituição de água doce por efluentes sanitários tratados em uma instalação próxima a uma cidade. O estudo buscou compreender o modelo de negócios subjacente a essa alternativa e explorar o potencial de replicá-lo em unidades operacionais próximas de centros urbanos. Uma unidade localizada na bacia hidrográfica do Rio Doce (MG), região com estresse hídrico, foi escolhida como estudo de caso para o desenvolvimento do projeto. “A utilização de efluentes tratados nessa unidade tem se mostrado capaz de substituir algumas das captações de água doce atualmente utilizadas pela Vale, contribuindo para uma maior disponibilidade de água na região”, relata Soares.
Outra frente de ação se dá na melhoria da eficiência hídrica do processamento mineral. No Pará, cerca de 80% da produção já se baseia no processamento a seco. A principal planta de Carajás (PA) está em processo de conversão para umidade natural, que consome menos água nova que o processamento a seco. Onze das 17 linhas de processamento da fábrica já são secas e as seis linhas restantes serão convertidas até 2023. Também no Pará, as plantas de processamento de Curionópolis e Canaã dos Carajás não utilizam água para concentrar o minério.
Evolução e tendências
A escassez de recursos hídricos é um dos principais desafios que o setor de mineração enfrentará no futuro, avalia Renata Andries, analista master de Recursos Hídricos da Vale. Segundo ela, o agravamento da crise climática, com o aumento das temperaturas e a ocorrência de eventos climáticos extremos, está levando à redução na disponibilidade de água em muitas regiões do mundo e, nesse cenário, algumas tendências devem afetar o uso de água pela mineração no futuro. Uma delas é a de maior sustentabilidade e eficiência hídrica, demandando mudanças significativas em direção a práticas mais sustentáveis, com foco em tecnologias e processos mais eficientes no uso da água, como reciclagem, reuso e tecnologias de economia hídrica.
Também a pressão regulatória para reduzir o impacto ambiental das operações minerais, incluindo o uso da água, está crescendo e deve levar as empresas de mineração a adotarem práticas mais responsáveis e transparentes. Em paralelo, diz Renata, a conscientização da sociedade sobre questões ambientais pode afetar a reputação das empresas, o que também influenciará suas práticas em relação à água.
No campo da inovação, a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias inovadoras, podem ser fundamentais para reduzir o consumo de água, tornando processos como o de mineração a seco mais comuns. Também será vital a articulação de parcerias entre mineradoras, organizações governamentais e não governamentais e comunidades locais, buscando equilibrar as necessidades da indústria com a preservação dos recursos naturais, de forma a definir estratégias de gestão integrada de recursos hídricos. O cenário atual será afetado, ainda, pela localização geográfica dos recursos hídricos visto que, em regiões já afetadas por sua escassez, a mineração pode enfrentar desafios mais urgentes e uma pressão maior para adotar práticas sustentáveis.
“A implementação de estratégias visando minimizar o consumo de água na indústria mineradora é crucial não apenas para assegurar o abastecimento hídrico às gerações vindouras, mas também para salvaguardar o meio ambiente. Globalmente, antecipa-se que a utilização de água na mineração evoluirá para práticas mais eficientes e sustentáveis. Contudo, é imperativo que as empresas mineradoras adotem medidas concretas para mitigar o impacto de suas operações nos recursos hídricos”, conclui Renata.
Foto em destaque: Aspersão de polímero sobre vagões de minério de ferro em Itabira (MG) (Daniel Mansur/Studio Pixel)