QUANDO A OPERAÇÃO NÃO PODE PARAR

QUANDO A OPERAÇÃO NÃO PODE PARAR

Energia01Antes mesmo de o mercado entrar em estado de alerta, diante do risco de desabastecimento de energia e seus reflexos na produção industrial, o assunto já vinha merecendo atenção em fóruns que debatem as mudanças climáticas no planeta. Devido ao predomínio hidráulico na matriz energética brasileira, que torna o sistema dependente do regime hídrico, a possibilidade de longos períodos de seca – com os reservatórios operando abaixo do nível – coloca em cheque não apenas o abastecimento da população, mas também das indústrias e, em particular, das mineradoras.

As preocupações não se restringem às mineradoras de pequeno porte, que buscam alternativas para possíveis interrupções no fornecimento de energia pelas concessionárias e a queda na qualidade do serviço. Ela se estende também às grandes mineradoras, que possuem contratos de longo prazo para compra de energia no mercado (PPA) e são abastecidas por linhas de alta tensão, com uma subestação dentro de suas minas. “Mesmo nesse caso, onde há muitos contratos vencendo, há uma preocupação com a disponibilidade de energia para entrega e a tendência de alta no seu preço”, afirma José Bruzadin, gerente de vendas da área de geração distribuída da GE.

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José Bruzadin, da GE

O nome dado a essa área da empresa, aliás, traduz o que Bruzadin considera um caminho para o suprimento das mineradoras. Na sua visão, a proliferação de usinas na ponta da rede, gerando energia para as localidades em que estão instaladas, contribuirá para reduzir os riscos de pane no sistema elétrico interligado. “A tendência é a complementaridade e uma maior diversificação na matriz”, diz ele. Isso significa que, em adição à rede elétrica, muitas empresas podem instalar usinas térmicas a gás natural, geradores a diesel ou outras fontes de energia para seu abastecimento in loco.

Usina plug-and-play – Para se ter uma idéia do nível de risco, há de se considerar que o clima de insegurança no abastecimento ocorre em um momento de desaceleração econômica, portanto marcado por queda no consumo de energia. Em janeiro, por exemplo, enquanto o consumo industrial caiu 4,7% em relação ao mesmo mês de 2014, totalizando 13.822 GWh, o da mineração aumentou 25%, com destaque para Minas Gerais (+33%), Espírito Santo (+22%) e Pará (+21%). Os dados são da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão do governo Federal, que atribui o fenômeno ao aumento na produção de minério de ferro e de Onça Puma.

Para fazer frente a suas demandas, muitas mineradoras já pressionam as distribuidoras de gás natural a estender suas respectivas redes até a porta da mina, especialmente em Minas Gerais. “Com isso, elas podem implantar projetos de cogeração, que atingem níveis de eficiência de 85% contra cerca de 35% a 40% na geração a diesel”, diz Bruzadin. Mesmo assim, ele avalia que esses projetos são para médio prazo, já que estão condicionados à construção das linhas de dutos para transporte do gás natural.

Segundo o especialista, a GE oferece soluções de geração distribuída movidas a gás natural, para projetos de até 20 MW de potência instalada, empregando motores de 100 kW a 9.500 kW. Nos projetos maiores, de 20 MW a 110 MW, a sugestão é o emprego de turbinas aeroderivadas, assim chamadas por serem desenvolvidas a partir do mercado de aviação, que operam com diversos tipos de combustíves destilados (etanol, biodiesel e outros). “Trata-se de uma usina plug-and-play, instalada sobre carreta e que pode se deslocar e entrar em operação rapidamente em qualquer ponto da mina”, diz Bruzadin.

Aggreko - The Gas Fired 175MW Ressano Garcia power plant in Mozambique.
Grupos-geradores operando em mineração

Múltiplas aplicações – Essas soluções, entretanto, ainda são uma possibilidade para o médio prazo e, atualmente, o setor trabalha com a perspectiva de utilizar geradores a diesel. Segundo fabricantes e locadores desse tipo de equipamento ouvidos pela In The Mine, as consultas das mineradoras nessa área cresceram de 20% a 25% nos últimos meses, embora os pedidos tenham aumentado em menor proporção. “Além do risco de racionamento, a ameaça de quedas de energia inesperadas tem levado ao aumento na busca por soluções de back-up personalizadas”, diz Pablo Varela, diretor geral da Aggreko, que atua na locação para mineradoras.

Ele ressalta que os equipamentos também podem ser empregados para fornecer energia em exploração de minas remotas, durante a expansão ou rump-up de projetos ou a alimentação de escavadeiras elétricas. “Nessas situações, o ganho é diretamente proporcional à produção e cotação do minério, uma vez que nossas soluções eliminam o tempo de parada de produção e, consequentemente, aumentam a produtividade.” Como exemplo, Varela cita uma planta de 11 MW, instalada em uma mineradora de ouro no Amapá, que vem fornecendo energia contínua para suas operações desde 2011, como alternativa à impossibilidade de a concessionária estender sua rede até o local.

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Varela, da Aggreko

A empresa fornece equipamentos a partir de 30 kVA, sendo que as configurações mais requeridas em mineração vão de 125 a 500 kVA, nas aplicações de geração distribuída, e de até 1.250 kVA, para atender maiores demandas de carga. “A arquitetura adotada varia de acordo com os perfis de carga, contemplando desde geradores em modo ilha de diversas potências, para abastecimento em pontos remotos ou paradas de manutenção, até a geração em paralelo, com equipamentos de 1.250 kVA, para atender demandas pontuais de carga, como partidas de moinhos de bolas e de britadores”, completa Varela.

Horário de pico – Segundo Jorge Luiz Buneder, presidente da Stemac, os geradores fabricados pela empresa também podem operar em horários de pico, das 17h às 22h, substituindo o fornecimento da concessionária e proporcionando uma economia de até 35% no custo de energia. “Como trabalham em ambiente severo nas mineradoras, o importante é que os equipamentos sejam protegidos em contêineres e contem com filtros para eliminação de poeira; além disso, oferecemos todo o suporte aos usuários para o melhor posicionamento dos geradores em função das correntes de ventos”, ele completa.

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Thiago, da Cummins

O engenheiro de vendas da Cummins Power Generation, Thiago José Martinelli, confirma a economia proporcionada pelo uso de geradores em horário de pico, mas ressalta que o ganho é mais efetivo com o emprego de gás natural. “Nesses casos, o custo de geração chega a R$ 0,60 por kWh e o investimento se paga no prazo de dois a três anos”, diz ele. Já o consultor de vendas da Sotreq, Aislam Francisquini, questiona esse ganho. “É possível, mas tudo depende da classe tarifária em que se enquadra o usuário, pois o combustível representa 90% do custo do kWh gerado nessas condições”, ele completa.

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Buneder, da Stemaq

A linha de geradores fabricada pela Stemac conta com modelos de 25 a 3.000 kVA, fornecidos juntamente com painéis de controle, sistemas de partida e parada automática. A Cummins, por sua vez, disponibiliza equipamentos de 65 a 4.000 kVA, que também podem ser configurados para operações severas, contando com sistemas de controle, carenagem e filtros para sua proteção. O destaque da linha é um modelo de 1.250 kVA, indicado para locações devido a seu baixo custo operacional. Entre outras características, ele conta com radiadores laterais, para evitar obstruções por poeira, e suporta temperaturas de até 50ºC em operações contínuas.

De acordo com Thiago Martinelli, da Cummins, dois equipamentos de 2.500 kVA operam em uma mina de ferro no Norte do país, gerando energia em média tensão (13,8 kV) para suprir a demanda em pontos remotos. “Como eles são instalados em carreta, podem se locomover para esses locais e entrar em operação rapidamente.” O especialista destaca que o dimensionamento dos geradores depende de diversas variáveis, como o regime de operação do usuário, se ele trabalha com cargas intermitentes ou não, a sequência de partida dos seus equipamentos e outros.

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Geradores sobre carreta: energia plug-and-play

Locação ou BOT – Os cuidados com a manutenção também são fundamentais para a eficiência na operação e até mesmo para que o usuário possa contar com o equipamento na hora que precisar. O gerente de vendas de aplicações especiais da Sotreq, Marcelo Tadeu, destaca que essa preocupação deve ser ainda maior nos geradores que ficam em stand-by, para suprir energia em situações de emergência. “Nesses casos, além das trocas de óleo e de filtros, é recomendável a partida dos equipamentos em períodos pré-estabelecidos”, diz ele.

A linha oferecida pela empresa abrange modelos de 50 kVA a plantas de até 5 MVA, indicadas para produtores independentes. Segundo Tadeu, os geradores também podem ser instalados em contêineres, transformando-se em “verdadeiras subestações móveis e abastecendo até mesmo as escavadeiras elétricas na frente de lavra”. Em uma mina de fosfato, a Sotreq instalou quatro equipamentos de 2.000 kVA que geram energia em baixa tensão para o bombeamento de resíduos na frente de lavra. “Eles foram fornecidos para atender um projeto de expansão da mineradora, que não conseguiu aumentar o suprimento de energia junto à concessionária.

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Tadeu, da Sotreq

A utilização de geradores ainda é um negócio fortemente apoiado na locação, que elimina as despesas de capital (capex) para o usuário. Esse modelo tem funcionado até mesmo em aplicações contínuas, onde os equipamentos complementam o abastecimento em pontos específicos da mina. Entretanto, se a demanda de complementação aumentar – devido a racionamentos ou a ausência de linhas de transmissão até a mina – as mineradoras estarão diante de um impasse no equacionamento de seus custos.

Antecipando-se a esse cenário, a Sotreq já desenvolveu parceiros para oferecer os equipamentos em regime BOT (built-operate-transfer) aos usuários. “Já temos algumas propostas em análise, para fornecimento de energia em contratos de 10 a 20 anos”, conclui Tadeu.

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Ventilação eleva custos em mina subterrânea

Energia pode chegar a 30% dos custos

Pelas avaliações de Leonardo Faria, gerente de desenvolvimento de negócios da GE Mining, o consumo de energia elétrica representa entre 10% e 30% dos custos operacionais de uma mineradora. “Seu peso varia em função do processo de beneficiamento adotado, da localização da mina e suas condições de acesso à infraestrutura de energia, mas, em geral, podemos dizer que se situa na faixa de 10%, nas mineradoras de ferro, e que pode variar de 25% a 30% em processos de concentração mais complexos, como as mineradoras de cobre”, diz ele.

Em geral, o principal centro de carga na planta, que responde pela maior parcela do consumo, é a moagem, seguida pela britagem e pelos equipamentos de movimentação de materiais, como correias transportadoras e retomadoras de rodas de caçamba. Em minas subterrâneas, entretanto, essa relação muda drasticamente, pois o sistema de ventilação das galerias, altamente dependente de energia, chega a representar cerca de 40% dos custos operacionais.

Matéria Publicada na edição 55 da revista In The Mine.

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