“PARA ONDE VAMOS? E EM QUE RITMO?”

“PARA ONDE VAMOS? E EM QUE RITMO?”

Em entrevista no encerramento do XI Simpósio Brasileiro de Exploração Mineral (SIMEXMIN), o diretor presidente da Agência para o Desenvolvimento e Inovação do Setor Mineral Brasileiro (ADIMB), Marcos André Gonçalves (foto), fez uma avaliação do evento, que aconteceu em Ouro Preto (MG) de 19 a 22 de maio passado.

Ele destacou o tema desta edição, a transição energética – o que, de acordo com ele, despertou um interesse ainda maior no simpósio; falou sobre a necessidade de mais transparência e diálogo do setor com a sociedade; do novo perfil do público interessado no evento e também de uma possível mudança de sede em um futuro próximo.

A programação do evento contou com sessões temáticas e painéis com a participação de um público diversificado, durante três dias. Sua XI edição, a mais concorrida de todas as realizadas, teve grande audiência em todos os painéis e palestras, com auditórios sempre cheios. “Estamos muito satisfeitos. Este evento foi o maior que já fizemos, com 62 estandes, 15 patrocinadores e mais de 1.400 inscritos no Brasil e vindos de outros oito países. Conseguimos reunir aqui, além de geólogos e engenheiros de minas, um público muito variado, com empresas, universidades, estudantes, institutos diversos, governo e um parlamentar federal”, disse ele.

A necessidade de energia limpa, que modifica a economia global, com suas consequências para a pesquisa e prospecção mineral em vários níveis, foi o tema central da programação. “O assunto representa uma oportunidade ímpar para o Brasil. Porque o cenário é outro, o mundo está mudando e é preciso ter mais transparência, o setor precisa se adaptar aos novos tempos. Não podemos repetir os erros do passado. O foco da ADIMB é muito mais o tema técnico-científico, profissional. Mas claro, as discussões políticas do setor estão colocadas e, nesse sentido, foi muito importante a vinda do deputado federal Zé da Silva (Solidariedade-MG), que preside a Frente Parlamentar da Mineração Sustentável no Congresso, para participar das discussões”.

Com a mudança de cenário na mineração, ele diz que já é possível notar outro perfil dos expositores. “No caso dos minerais críticos, você vai precisar de equipamentos que não tinha antes. Então, já percebemos uma mudança do tipo de expositor, além, é claro, da presença do expositor tradicional. Dessa vez tivemos empresas com perfil industrial, como as de engenharia. Além disso, quase 50% dos expositores presentes nesta edição não são associados da ADIMB e decidiram vir, mesmo pagando mais caro. São empresas voltadas para os minerais críticos, como lítio, terras raras e grafita. Já é uma mudança, porque antes era só mineração de metais, como ferro, cobre, níquel, chumbo e zinco. Houve também o caso de uma empresa de engenharia, da área de construção, que precisa de matéria-prima, e veio aqui para entender melhor como funciona o setor. É um movimento interessante”, conta.

Durante a entrevista, o presidente da ADIMB lembrou, em mais de uma oportunidade, que o papel da entidade não é discutir política. “Nós não entramos nessa seara, já que existem duas entidades setoriais que fazem isso, que são o IBRAM (Instituto Brasileiro de Mineração) e a ABPM (Associação Brasileira de Pesquisa Mineral). Estamos aqui pra discutir tecnologia e inovação, que são questões mais estratégicas. Estamos aqui para fazer, porque que está dando certo tem que ser visto e mostrado. Esse evento cheio é fruto do nosso trabalho, é a consequência de muito investimento e de um planejamento estratégico que começou lá atrás, desde 2017, justamente pra discutir essas mudanças. Para onde vamos e em que ritmo?”, indaga.

Mas para onde ir (e em que ritmo) é uma questão que vai muito além dos rumos da ADIMB. Afinal, os desafios do setor mineral são inúmeros e complexos. Além do novo cenário da transição energética, cuja tecnologia para carros elétricos vai depender e muito das reservas minerais brasileiras, há os entraves burocráticos, que inibem investimentos; as crises, como os desastres de Mariana e Brumadinho (MG), e a consequente imagem da mineração para a sociedade; além da falta de uma política governamental clara.

“Precisamos interagir mais. O setor precisa se organizar e aparecer. Em geral o minerador não quer falar sozinho, o que é natural, para não personalizar a crítica”, afirma. A imagem do setor, por exemplo, é sempre um ponto sensível nas discussões. “Hoje a rejeição dos jovens à mineração é grande. Não vamos mudar isso em cinco ou dez anos. Temos que ter outro tipo de referência em nível escolar, estar mais próximos das comunidades, fazer chegar à sociedade o que a mineração faz”, explica.

A questão dos investidores e do mercado de capitais, tema de um dos painéis mais concorridos no simpósio, é outro exemplo, segundo ele. “Por que não temos, no Brasil, um mercado de capitais para investir em mineração? A Bolsa de Toronto, no Canadá, possui mais de 1.600 empresas de mineração. Na minha visão, parte da dificuldade em desenvolver uma bolsa para a mineração decorre da falta de entendimento, de aceitação do que é a mineração pelo conjunto da sociedade. Como é que o cidadão de classe média vai colocar 500 reais em uma empresa de mineração, se acredita que perderá seu dinheiro quando estourar uma barragem?”.

O Simpósio acontece a cada dois anos e o gigantismo desta edição colocou em pauta a discussão sobre a sede do próximo encontro. O próprio Marcos Gonçalves se mostra dividido entre a necessidade de uma infraestrutura que atenda melhor ao público e a seus expositores e, por outro lado, a questão afetiva, pela representatividade de Ouro Preto, berço da exploração mineral no país, para tantos profissionais da área. “A relação com a cidade é sentimental, não só para mim, mas para muita gente que está no simpósio. Eu mesmo passei várias semanas aqui durante meu estágio de faculdade. Sem falar na história da mineração. Mas também não podemos fechar os olhos para a logística. Ter um aeroporto relativamente perto, por exemplo, facilita a vida de muita gente. Além disso, temos algumas questões estruturais neste espaço que começam a ficar complicadas com o aumento do público,” observa.

A necessidade de uma política clara para a mineração é outro ponto estratégico para que o setor possa avançar num novo cenário em que a prospecção, exploração e processamento dos minerais estratégicos será de grande importância para posicionar o Brasil na perspectiva internacional. “Você define o rumo, não dá pra ficar criando um monte de planos sem metas. Há outros temas importantes, como impostos e taxas excessivas, e a questão ambiental. Um ponto básico é colocar a Agência Nacional de Mineração (ANM) em pé, com funcionário, com capacidade operacional. Como entidade, a ADIMB está sempre defendendo essa necessidade e todos colocam muita esperança na ANM. Claro que entendemos toda a dificuldade do órgão, que foi criado há pouco tempo, mas ela também é parte da solução do problema da mineração no Brasil”, aponta.

Um dos esforços feitos pela ADIMB, segundo ele, é atrair cada vez mais outras entidades que possam trabalhar em conjunto com o setor mineral. “Estamos fazendo um movimento para chegar aos mineradores, principalmente os de porte pequeno e médio, em conjunto com empresas como o SENAI (Serviço Nacional da Aprendizagem Industrial), ITAC (Instituto Tecnológico de Avaliação e Certificação da Conformidade), Fundação Gorceix, CDTN (Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear) e CIMATEC (Centro Integrado de Manufatura e Tecnologia), por exemplo, que podem atuar em projetos colaborativos. É um trabalho que os australianos realizam desde 1956. E nem a ADIMB nem ninguém quer reinventar a roda”, conclui.

(Por: Paulo Boa Nova)
Foto: ADIMB/Divulgação

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