Entre os dias 12 e 15 de setembro passado, Belo Horizonte, capital de Minas Gerais (MG), teve temperaturas variando entre 33 e 34°C. O clima, em final da estação de inverno no Brasil, favorecia as caminhadas, os encontros, a confraternização. Foi o mesmo clima refletido no interior do Expominas, onde foi realizada a Exposibram – Exposição e Congresso de Mineração – naquele período, após três anos de adiamento desde a edição anterior, em 2019.
Sustado pela pandemia de Covid-19, o evento, que deveria ter acontecido em 2020, em Belém, foi realizado de forma online nesse ano e em 2021, ainda pelas restrições da crise sanitária. Com a vacinação em massa da população, pode finalmente ser concretizado em 2022, de volta ao território mineiro.
O espírito geral foi de celebração. Segundo números divulgados pelo Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), organizador da mostra, o setor, que atravessa um ciclo econômico bastante favorável, respondeu maciçamente à oportunidade de reencontro. Foram 61 mil visitantes que acessaram a área de 13 mil m2 do Expominas, ocupada por 450 estandes de expositores nacionais e internacionais. Rodadas de negócios entre 20 mineradoras e empresas fornecedoras de produtos e serviços, somando 300 reuniões, podem gerar cerca de R$ 6 bilhões em futuras aquisições e contratações. O congresso teve 46 sessões, 55 palestras técnicas e 11 minicursos, apresentados por 240 participantes, entre palestrantes, debatedores e mediadores – para um público de quase 2 mil pessoas.
Na cerimônia de abertura estavam presentes, entre outras autoridades, a secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral (SGM) do MME, Lilia de Mascarenhas Sant’Agostino, o diretor-presidente do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Pedro Paulo Dias Mesquita, além de embaixadores do Peru, Coreia do Sul, Países Baixos e Irã.
O talk show “Cenário Macroeconômico e Político”, na sequência da abertura, contou com pronunciamentos iniciais de Raul Jungmann, presidente do IBRAM, e Wilfred Theodoor Bruijn, presidente do Conselho Diretor da entidade e CEO da Anglo American Brasil. Participaram do fórum, moderado por Cláudio Boechat, professor da Fundação Dom Cabral, o ministro de Minas e Energia (MME) Adolfo Sachsida e o governador de Minas Gerais Romeu Zema, de forma remota, além da presidente da Mosaic Fertilizantes, Corrine D.Ricard, através de mensagem gravada em vídeo. Também falaram a diretora de Joint Ventures e contry manager no Brasil da Rio Tinto, Ana O’Farrill, e o vice-presidente de Assuntos Corporativos da Vale, Alexandre D’Ambrosio.
Eixos temáticos
Os temas abordados no talk show refletem os caminhos que a mineração brasileira – seja em políticas públicas ou estratégias privadas – já vem traçando nos últimos anos e pretende concretizar em um horizonte futuro. Em sua maioria, pautados por pressões de agentes externos, que impõem ao setor a observância da sustentabilidade de suas operações, condição para manter a competitividade global do negócio.
A banca do talk show foi unânime em reconhecer o imperativo da transição energética, dependente da produção de minerais estratégicos – lítio, nióbio, terras raras, cobre e vanádio, principalmente. Outra frente é a descarbonização dos processos produtivos, reduzindo as emissões de poluentes nas rotinas operacionais (eletrificação da frota móvel de equipamentos, por exemplo) e em plantas de processamento, de forma a gerar os chamados minérios “verdes”, cujos benefícios ambientais se estendem da atividade mineral a aplicações industriais posteriores. É o caso do emprego recente de polímeros pela Vale, agregando o minério de ferro em pequenos briquetes e contribuindo para a redução do consumo de energia na produção de aço, como explicou D’Ambrósio. A empresa, segundo ele, também vem investindo em energia solar e eólica, em linha com sua estratégia de se tornar uma empresa “carbon free” até 2060.
Sachsida disse que um dos objetivos do MME é dobrar a participação do setor mineral no PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, de cerca de 2,8% em 2021 para 4,8%. A meta é necessária para incrementar a transição energética, inviável sem a mineração. “Para isso, vamos melhorar os marcos legais, ampliando a segurança jurídica do setor”, afirmou o ministro. Como exemplos de medidas já regulamentadas, ele destacou o decreto nº 11.120/2022, que permite a importação e exportação de minerais e minérios de lítio e seus derivados, e a MP (Medida Provisória) nº 1.133/2022, que trata da INB (Indústrias Nucleares do Brasil) e da pesquisa, lavra e comercialização de minerais nucleares.
Jungmann destacou a importância da adoção de dois eixos fundamentais: o conceito ESG (Meio Ambiente, Social e Governança na sigla em inglês) e inovações tecnológicas como block chain (rastreamento da cadeia produtiva) e machine learning (aprendizado de máquina), recurso possibilitado pelo uso da IA (Inteligência Artificial). “Esses dois eixos são globais, caminham juntos e impactam o setor (mineral)”, justificou o presidente do IBRAM.
Também se referindo ao ESG, Ana O’Farril lembrou que a Rio Tinto passou um evento traumático recente em relação à forma como se relaciona com a comunidade. Embora sem especificar, a executiva referia-se ao sítio arqueológico que abrigava cavernas milenares e sagradas para povos indígenas, datadas de 46 mil anos atrás, na região de Pilbara, Austrália. Esse patrimônio foi implodido para a expansão da mina de minério de ferro da empresa, em 2020, mobilizando a população australiana e a sociedade científica mundial. Além de levar à demissão do CEO da Rio Tinto à época, Michael L’Estrange, o desastre motivou a revisão dos marcos legais do país, para proteger os territórios de seus povos originários e evitar o risco de novas ocorrências do tipo. “Estamos passando por um ‘reset’ para reconhecer nosso impacto nas comunidades, para reconhecer nossos erros e corrigi-los. Precisamos saber falar e escutar”, disse O’Farril.
D’Ambrósio disse que também a Vale precisou se reinventar e reconhecer a importância da escuta ativa da comunidade desde Brumadinho (rompimento da barragem B1 da mina Córrego do Feijão, na cidade mineira de Brumadinho, em 2019). Ele considerou que a inovação, como falou Jungmann, é um tema fundamental para a mineração, mas que não se trata somente de tecnologia. “É também a maneira de se relacionar com as comunidades”, afirmou. Lembrando que Brumadinho foi “uma tragédia sem precedentes”, D’Ambrosio agradeceu a presença de membros da Avabrum (Associação de Vítimas de Brumadinho), que faziam um protesto com faixas e cartazes à frente do palco, e pediu um minuto de silêncio em respeito às vítimas, seus familiares e atingidos pelo acidente.
Por sua vez, Bruijn lembrou que a Anglo American tem 150 anos de existência, sendo 50 deles com operações no Brasil. “Sabemos que a mineração sempre vem depois que uma comunidade se instalou e se desenvolveu no entorno da operação. Temos que estabelecer um diálogo e criar uma relação de confiança com essa comunidade”. Bruijn também destacou outro tema caro ao setor: a diversidade e inclusão. “Estamos iniciando o programa Everyone, que busca criar em nossas operações um ambiente psicologicamente seguro para que todos os funcionários possam expressar suas posições e aflorar sua produtividade e criatividade”, considerou o executivo.
Outra preocupação do setor, destacou o presidente do IBRAM, é o garimpo ilegal. “É possível minerar em Terras Indígenas. Mas não na forma do garimpo ilegal, que destrói o meio ambiente e as comunidades locais. Já pedimos ao Banco Central e à Polícia Federal o rastreamento da cadeia de ouro ilegal”, completou.