INGRESSO EM IMÓVEL DE TERCEIRO PARA PESQUISAS ADICIONAIS

por-williamfreire

O foco deste artigo é a necessidade de o minerador ocupar imóvel de terceiro para pesquisa adicional após a apresentação do Relatório Final de Pesquisa — RFP.

O estudo parte da análise do art. 9º, § 7º do Regulamento do Código de Mineração: “Encerrado o prazo da autorização de pesquisa e apresentado o relatório de pesquisa, o titular, ou o seu sucessor, poderá dar continuidade aos trabalhos, inclusive em campo […].”

Já nesse ponto, vale interessante reflexão: Não foi o Regulamento do Código de Mineração que “criou” o direito à pesquisa adicional após a apresentação do RFP, porque essa disposição interferiria em diversas relações jurídicas, inclusive na de sujeição do imóvel (e intervenção na propriedade privada) à atividade mineral numa fase em que não há título minerário (mas em que o minerador não deixa de ter vários direitos decorrentes do seu processo minerário ativo).

Como não há, no Código de Mineração e em leis correlatas, disposição sobre a continuidade da pesquisa após a apresentação do RFP, essa lacuna normativa foi preenchida por precedentes do então Departamento Nacional de Produção Mineral — DNPM e da Agência Nacional de Produção Mineral — ANM.

Tanto assim é, que se admitiu, a partir de reiteradas opiniões da Procuradoria Federal Especializada e decisões do DNPM, desde 2004, e a partir de decisões da ANM, a outorga de Autorizações Especiais (ou complementares) de Pesquisa, fazendo desaparecer a lacuna normativa e inserindo as Autorizações Especiais de Pesquisa no sistema jurídico-minerário.

Nesse período pós-apresentação do Relatório Final de Pesquisa, o minerador — apesar de ser titular de um processo administrativo em curso — não tem um título minerário. A autorização de pesquisa venceu e ainda não há a concessão de lavra.

Como o minerador fará para ingressar em imóvel de terceiro se não tiver acordo com o superficiário?

A primeira hipótese é ir ao Judiciário e explicar seu direito de continuar a pesquisa e dar sequência no procedimento para avaliação de rendas e danos, combinando o art. 9º, §7º do Regulamento do Código de Mineração com o art. 27 do Código de Mineração.

Entretanto, ir diretamente ao Judiciário apenas com esse argumento apresenta alto risco, porque os juízes estão acostumados a receber as petições iniciais instruídas com o laudo de Servidão Mineral emitido pela ANM.

Para evitar esse risco, vale analisar duas questões:

  1. A ANM pode emitir o laudo técnico para instituição de Servidão Mineral no período compreendido entre a entrega do RFP e antes da outorga da concessão de lavra?
  2. As Autorizações Especiais de Pesquisa ainda estão no sistema jurídico-minerário?

As respostas são diretas.

A ANM não apenas pode, como facilitará a vida do minerador, emitindo o laudo técnico de Servidão Mineral. O processo administrativo está ativo, o minerador necessita ingressar em imóvel de terceiro e encontra resistência.

As Autorizações Especiais de Pesquisa não saíram do mundo jurídico em razão da publicação do Novo Regulamento do Código de Mineração. E isso por motivo muito simples: as Autorizações Especiais de Pesquisa já existiam no mundo jurídico, em razão do preenchimento de uma lacuna normativa mediante decisões do DNPM e da ANM.

Lacunas normativas sempre são preenchidas no nível das leis formais. E foi preenchida após reiteradas decisões do DNPM sustentadas, desde 2004, em Pareceres consistentes da Procuradoria Jurídica. Os regulamentos, sejam na roupagem de decretos ou Resoluções da ANM, como o próprio nome indica, nada mais fazem do que regulamentar o que já existe no mundo jurídico, numa esfera superior.

Se as Autorizações Especiais de Pesquisa já integravam o sistema jurídico-minerário, não será um Decreto — classe inferior na hierarquia normativa — que as retirará do mundo jurídico.

Além dos aspectos jurídicos bastante óbvios, Autorizações Especiais de Pesquisa justificam-se também sob o ponto de vista prático:

  1. Constituem título minerário;
  2. Se há título, é inócua a discussão sobre se cabe ou não a Servidão Mineral em favor dele;
  • Se há título minerário, não suscitará dúvida no juiz que cuidará da constituição judicial da Servidão Mineral;
  1. Se há título minerário, não criará dúvida no órgão ambiental nos casos em que a pesquisa adicional depender de licenciamento ambiental.

Necessário, portanto, firmar o entendimento acerca das pesquisas adicionais.

Há duas situações jurídicas completamente distintas e independentes:

Uma situação é a do art. 9º, §7º do Regulamento do Código de Mineração. Trata-se de uma faculdade do minerador, de alcance limitado, e independe de prévio consentimento da ANM.

Outras situações são as que não se encaixam nas hipóteses do art. 9º, §7º do RCM.

Boas regras de interpretação jurídica recomendam buscar decisões que, respeitando o Princípio da Legalidade, fomentem, estimulem, evitem a burocracia, criem soluções jurídicas e auxiliem a superar os (muitos) percalços que a mineração já enfrenta.

1Advogado, professor de Direito Minerário e Direito Ambiental Aplicado à Mineração, sócio fundador da William Freire Advogados Associados

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