IN THE MINE
Edição 84
Mine Legislação
Por William Freire[1]
A aplicação do Direito ao fato concreto é sempre desafiadora, como confirmam as divergências doutrinárias e jurisprudenciais eternas.
O desafio é maior quando se trata do Direito aplicado aos fatos jurídicos decorrentes da atividade mineral. Um Código de Mineração defasado no tempo; um decreto regulamentador fraco e tímido e os regulamentos do antigo DNPM que, por esforço da ANM digno de elogio, finalmente serão modernizados (basta considerar a Instrução Normativa 01/83, que ainda vigora parcialmente).
Então, conhecer os métodos tradicionais para a aplicação das normas jurídicas (regras e princípios) é de extrema importância. Divergências de interpretações de boa-fé serão sempre possíveis quando nos deparamos com ciências não exatas. Entretanto, podemos, com um pouco de cautela, evitar erros crassos.
Algumas regras básicas:
O fato e suas circunstâncias são bem conhecidos? Não há como aplicar a lei se o aplicador não conhece o fato e os detalhes que o cercam. Cada caso tem seu detalhe. Portanto, um precedente genérico não se aplica, necessariamente, ao caso futuro, mas pode servir de guia para o raciocínio.
Há regra aplicável, clara e direta? Exemplo: As autorizações de pesquisa devem ser sempre por prazo determinado (CF, art. 176).
Há proibição expressa? Por exemplo, a impossibilidade de outorga de autorizações de pesquisa a estrangeiros não naturalizados ou concessões de lavra a empresas que não tenham sido constituídas sob as leis brasileiras e que não tenham sede e administração no Brasil.
Se não houver regra clara para o caso, há outra regra que pode ser tomada como analogia? Outro exemplo simples: não há regra que determine que a prorrogação da autorização de pesquisa deve ser por prazo determinado (e nem por prazo indeterminado). Mas há a regra do art. 176 da Constituição, que pode ser tomada para aplicação analógica sem muito esforço: se a autorização de pesquisa deve ser por prazo determinado, não há razão para a sua prorrogação também não ser por prazo determinado.
E se não houver regra que possa ser tomada para aplicação analógica com tanta evidência como a mostrada acima? Deve-se buscar, como primeira regra, alguma da mesma natureza: no caso em estudo, deve-se buscar uma norma de Direito Administrativo; se não houver, utiliza-se regra existente em outro ramo do Direito.
O Código de Mineração, seu regulamento, a Lei 9.784/99, ou o Regimento Interno da ANM, não dispõem sobre a possibilidade de um diretor, em julgamento colegiado, retificar seu voto antes da publicação do resultado. A solução, então, é buscar orientação no Código de Processo Civil e na jurisprudência processual civil, que admitem revisão e retificação do voto antes da conclusão do julgamento.
Esses são exemplos muito simples, considerando o espaço disponível e o veículo (uma revista)
Mas, e se houver a necessidade de o aplicador da lei considerar as características da atividade (como a rigidez locacional – absoluta ou relativa, sua utilidade pública e o interesse nacional) e se valer de princípios jurídicos? Como ponderar os princípios jurídicos? Como considerar a aplicação das regras e dos princípios em relação ao caso concreto? Como se aplicam os princípios jurídicos que contêm núcleo de sentido forte?
Cada caso é um caso, mas há uma regra elementar: sem método de análise, o risco de se chegar a uma decisão equivocada é enorme.
[1] WILLIAM FREIRE é advogado formado pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Autor de diversos livros sobre Direito Minerário e Direito Ambiental, entre eles o Direito Ambiental Brasileiro, o Código de Mineração Anotado, o Comentários ao Código de Mineração, o Direito Ambiental Aplicado à Mineração, o Natureza Jurídica do Consentimento para Pesquisa Mineral, do Consentimento para Lavra e do Manifesto de Minas no Direito Brasileiro, Fundamentals of Mining Law, Gestão de Crises e Negociações Ambientais, Riscos Jurídicos da Mineração e o Direito Minerário: Acesso a imóvel de terceiro para pesquisa e lavra. Publicou mais de cem artigos e proferiu mais de cem palestras sobre Direito Minerário, inclusive no exterior. Árbitro da Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial Brasil – CAMARB e Diretor do Departamento do Direito da Mineração do Instituto dos Advogados de Minas Gerais. Fundador do Instituto Brasileiro do Direito da Mineração – IBDM. Professor de Direito Minerário em diversos cursos de pós-graduação. Por anos seguidos, considerado um dos mais respeitados consultores no Direito Minerário, por vários institutos.