ESPERANDO GODOT

Mentira. A mineração brasileira não espera Godot nenhum. Aquela entidade quase mítica da peça de Samuel Becket, cuja chegada dois maltrapilhos aguardam com a esperança de que dê fim a seus sofrimentos. Os problemas de nosso setor mineral estão num nível bem mais rés-do-chão, onde se espera somente a primeira reunião do Conselho Nacional de Política Mineral (CNPM).

Não é sem razão. É o CNPM que deverá “orientar a formulação, coordenação e articulação de planos, programas e ações do Poder Executivo Federal na mineração”. Leia-se: “ações voltadas ao aproveitamento econômico, social e ambientalmente responsável dos recursos minerais do país, visando à competitividade e ao desenvolvimento do setor mineral”.

Pois é… só que nada acontece. Note-se que, desde junho de 2022, já se tinha uma Política Mineral Brasileira instituída. O mesmo decreto (nº 11.108/2022) que o fez criou o CNPM, que tinha de tudo em sua távola redonda: ministros, representantes dos estados e do Distrito Federal (DF), dos municípios produtores e afetados pela mineração, sociedade civil e instituições acadêmicas com notório conhecimento do tema mineral.

É tanta gente que até hoje o CNPM não se reuniu, não debateu, não divergiu nem convergiu, muito menos deliberou e tornou pública sua decisão. Verdade seja dita que criado, o conselho não foi instalado senão no novo governo federal, em março de 2024 (há cerca de três meses), com formação mais enxuta: agora são “apenas” 19 membros – sendo 17 integrantes de ministérios, um representante da Agência Nacional de Mineração (ANM) e um do Serviço Geológico do Brasil (SGB). Pelo menos, a mesa poderá ser menor.

Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, que coordenará o seleto grupo, agendou sua reunião inaugural para 1º de abril. A data, sem falhar ao seu desígnio de pregar peças, enganar tolos ou espalhar boatos, não se fez de rogada: o encontro não aconteceu. Aliás, não foi remarcado e nada mais disse o ministro, nem lhe foi perguntado, dado que a mineração não parece interessá-lo demasiado.

Exceto se o assunto forem os famosos minerais críticos, cuja menção se emenda com a tal transição energética que, por sua vez, se emenda a políticas, planos e financiamentos específicos que, por alguma semelhança com a mítica cidade de Macondo, do clássico de García Márquez, acabam dando na foz do Amazonas. Mistério, já que lá não há minerais críticos nem estratégicos. Salvo se, o novo Plano Decenal de Mapeamento Geológico e Levantamento de Recursos Minerais (PlanGeo) anunciado junto com o CNPM, seja mais efetivo e descubra algo além de bilhões de barris de petróleo na margem equatorial do Amapá.

Pode ser que, quando esta edição sair da gráfica, tenhamos a grata notícia de que a primeira reunião do CNPM, se não se realizou, esteja reagendada. Será muito mais significativo para a mineração brasileira do que influir na presidência da Vale ou taxar operações minerais com o Imposto do Pecado. Oxalá assim seja!

Saudações pausadas,

Tébis Oliveira
Editora-adjunta

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