Há de vir o dia em que nossos parlamentares se inibam do péssimo hábito de criar oportunidades para tratar de assuntos absolutamente alheios ao objeto de projetos de lei, quando propõem substitutivos ao texto original. Fala-se aqui dos conhecidos “jabutis”, como são chamadas essas inclusões sem contexto, mas certamente com propósitos – por vezes inconfessáveis – formuladas por nossos eminentes representantes públicos no Congresso Nacional, a título de revisar – e nem sempre melhorar – as disposições dos projetos antes de convertê-los em lei.
Um desses jabutis foi recentemente colocado na copa da árvore do Projeto de Lei nº 2.337/21. Trata-se de um típico réptil com carapaça – consideradas as acepções das palavras réptil e carapaça -, visto que o citado PL tratava inicialmente da alteração da legislação do Imposto de Renda sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza das Pessoas Físicas e das Pessoas Jurídicas e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.
Uma passagem de ida para o Afeganistão a quem descobrir em qual parte desse enunciado o relator Celso Sabino (PSDB-PA) vislumbrou a coerência de legislar, em seu substitutivo, sobre a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM). Inclui-se a passagem de volta ao Brasil para o sábio que conseguir explicar também porque o nobre deputado elege os produtores de ferro, ouro, bauxita, cobre, manganês, caulim e níquel, em todo o universo do setor mineral, como os de maiores habilidades e competências para arcar com a majoração do tributo de 4% para 5,5%.
Não vale usar o mesmo argumento do iluminado deputado de que a redução do IRPJ dessas empresas compensará o aumento da alíquota da compensação, sem perdão do infame trocadilho. Até porque, a princípio, todas as mineradoras, e não apenas essas, devem pagar menos imposto de renda com a nova lei.
Acertadamente, o IBRAM (Instituto Brasileiro de Mineração) se posicionou contra o jabuti sabinense. O bicho pode ter carapaça, mas não tem pé nem cabeça. Haverá aumento de custos para implementar a elevação da alíquota, sem previsão de quem e como se irá bancá-los. Mas não só. O principal é que, segundo Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, consignada nas ADIs (Ação de Inconstitucionalidade) nº 4.606 e 6.233 e no RE (Recurso Extraordinário) nº 28.800, a CFEM “tem natureza jurídica de receita pública originária, não tributária”, e qualquer matéria a ela afeita não poderia ser incluída em um PL, no caso o 2.337/21, que trata de matéria tributária. Aguardemos a judicialização.
P.S.: Embora não seja um jabuti e se pareça mais a um elefante em loja de cristais, há o esboço e o esforço por uma nova proposta do Código de Mineração. Deixo o tema à abalizada opinião de William Freire, em artigo nesta edição.
Saudações constitucionais,
Tébis Oliveira
Editora