O projeto de Geometalurgia foi iniciado em 2020 no Complexo de Mineração Caeté (CCA), da Jaguar Mining, composto por duas minas subterrâneas – Roça Grande (RG) e Pilar, situadas em Caeté e Santa Bárbara (MG), respectivamente. A iniciativa foi motivada pelo desafio de melhorar a recuperação de ouro e garantir estabilidade operacional à planta metalúrgica RG, devido à variabilidade de processamento – recuperação, reologia de polpa, densidade relativa e efeito de sobremoagem – enfrentada na época.
Com a suspensão temporária da operação da mina RG em 2018, a planta metalúrgica passou por diversos problemas em função das alterações das caraterísticas do minério e da ausência de um estudo representativo. “Nesse contexto, uma equipe multidisciplinar da Jaguar iniciou o projeto de Geometalurgia, com o objetivo de caracterizar os corpos minerais da mina de Pilar para compreender seu comportamento, desde a extração até o processo metalúrgico, fornecendo subsídios necessários à avaliação das rotas de processo e possibilitando a otimização do rendimento global da usina”, explica Istelamares Alvarenga de Barros, gerente de Metalurgia do CCA.
Em seus diferentes momentos, o projeto contou com a participação de profissionais das áreas de Processos, Geologia, Laboratórios, Operação de Planta Metalúrgica, Mina e Manutenção. A etapa de planejamento do estudo e desenvolvimento da caracterização foi marcada pela atuação de engenheiros químicos, geólogos, analistas de processo e laboratório e profissionais da área de melhoria contínua. Durante a implantação das melhores condições de processamento industrial, coube à equipe operacional e de manutenção garantir a aplicabilidade dos conceitos do projeto. Essa multidisciplinaridade foi importante, avalia Istelamares, para uma abordagem não só mais holística, como também focada nos detalhes de cada área, considerando os múltiplos aspectos do processo de mineração.
Modificações
Os trabalhos de caracterização indicaram que os corpos de minério de Pilar apresentam particularidades para os processos de concentração de ouro, exigindo condições específicas de processo e operação para uma melhor recuperação e estabilidade da planta metalúrgica. Assim, a instalação deveria ter uma configuração flexível e robusta para absorver as variabilidades de cada minério e maximizar sua extração.
Essas readequações foram feitas gradativamente, lembra a gerente. Entre elas: a remoção de gargalos operacionais e o aumento da taxa de moagem para redução da granulometria de P80 para P75 µm; estudos e alterações dos parâmetros de classificação em hidrociclones; e a intensificação das inspeções e manutenções dos circuitos de processamento físico e químico.
No circuito de flotação foi implementada uma nova abordagem da gestão do tratamento de água cianetada e de sua reutilização no circuito de flotação para reduzir o seu impacto negativo na concentração do ouro. Os reagentes também passaram a ser aplicados conforme as características da flotação e foram avaliados novos coletores para a concentração de sulfetos contendo ouro. Na lixiviação intensiva do concentrado gravítico, consolidou-se a influência de cada variável na eficiência do processo, com redefinição dos parâmetros até então considerados. Ainda nessa etapa, o tempo de residência foi reduzido, a aplicação de oxigênio líquido foi otimizada e a cal foi substituída por uma suspensão de hidróxido de cálcio.
No campo geológico, foi definido um novo método de rastreabilidade, de forma a melhorar o monitoramento das características do minério e avaliar seu desempenho no modelo geológico da mina. A partir daí, a categorização do minério passou a ser realizada por frente de lavra, com transporte e amostragem separadamente na britagem. “Assim, conseguimos uma maior compreensão sobre a origem, gestão do minério e sua recuperação, do modelamento à etapa de processamento”, conta Istelamares.
Treinamentos
Na fase de implantação industrial, a capacitação da equipe visou garantir a integração eficaz de dados e a otimização dos processos. Entre outros, foram ministrados treinamentos sobre conceitos geometalúrgicos e padronização de práticas analíticas para a equipe de laboratório e sobre os conceitos de processos aplicados ao minério de Pilar e padronização operacional para a equipe da planta metalúrgica.
Já durante o desenvolvimento do projeto, para participar da discussão de algumas temáticas, a mineradora convidou consultores e especialistas em caracterização mineral e processamento de minérios de ouro, de entidades como a UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto) e Fundação Gorceix, além de fornecedores parceiros nas áreas de concentração gravítica, tratamento de água e insumos para moagem, por exemplo.
Resultados
Decorridos três anos de seu início, o projeto de Geometalurgia reuniu informações que levaram a novos conceitos e readequações, resultando em otimização operacional e economia de cerca de R$ 10 milhões. Entre os ganhos obtidos, Alberto Vilela da Costa, analista de processos do CCA, destaca a elevação de 0,49% na recuperação metalúrgica de ouro, entre 2021 e 2023 (88,50%), em comparação ao período de 2018 a 2020 (88,01%). A taxa de alimentação da moagem foi otimizada, com elevação gradual de 80,45 para 94,96 t/h (18,04%), reduzindo as horas efetivas de operação do moinho e, com isso, o consumo de corpos moedores em 7,87%, equivalente a uma economia de R$ 1 milhão.
Por sua vez, as adequações realizadas na área de concentração gravítica elevaram a recuperação de 47,64% (2018 a 2020) para 51,25% (2021 a 2023), um ganho de 3,61%. A redução de 34,75% do consumo de cianeto de sódio, de 1.131 g/t (2018 a 2021) para 738 g/t (2021 a 2023), gerou uma economia de R$ 7,54 milhões. Outros R$ 350 mil/ano foram economizados com a eliminação do uso de nitrato de chumbo.
Também foi registrada a elevação de 1,24% da recuperação de ouro na lixiviação, de 86,71% (2018 a 2020) para 87,95% a partir de junho de 2022. Em contrapartida, houve a redução de 37,22% do teor de ouro contido no rejeito desse processo nos mesmos períodos: de 3,52 g/t para 2,21 g/t.
Desafios
A concepção, desenvolvimento e implantação do projeto de Geometalurgia no CCA se deparou com complicadores derivados do aprofundamento das minas subterrâneas, do ineditismo de sua abordagem ampla, dos custos necessários à viabilização das adequações propostas e da resistência a novos conceitos e práticas.
Nesse rol, Istelamares destaca a falta de informação prévia e histórica da caracterização mineral dos corpos principais das minas Pilar e RG, para permitir a compreensão de quais variáveis foram se modificando ao longo do tempo, na medida em que a lavra subterrânea foi sendo aprofundada, e de como foi sendo alterada a proporção de contribuição de cada mina para a produção de ouro. Essa condição impôs outro desafio: o de conduzir um projeto inédito de caracterização mineral não apenas nas duas minas, mas na própria Jaguar, agravado pela meta de ampliar sua abordagem até a planta metalúrgica.
A equipe, que não era exclusiva do projeto, teve que alternar os novos estudos e atividades com sua rotina diária de trabalho. Também houve um impasse na concepção de teorias que corroborassem as observações obtidas nas análises laboratoriais e dados coletados no processo industrial, visto que, em muitos casos, as melhores condições se contrapunham às práticas convencionais. Foi necessário, ainda, romper paradigmas consolidados há muitos anos na empresa para promover modificações nos processos de recuperação de ouro e, por fim, adequar o cronograma de demandas e propostas à disponibilidade dos recursos financeiros necessários à sua execução.