Realizado no Rio de Janeiro 34 anos depois de sua última edição na cidade, o 49º Congresso Brasileiro de Geologia, terminou na última sexta-feira (24) com a leitura da Carta do Rio, que prevê uma série de propostas de políticas públicas para o incentivo ao desenvolvimento das Geociências no país. O documento será encaminhado aos candidatos à Presidência da República e aos governos estaduais, bem como à Câmara dos Deputados, Senado Federal e Assembleias Legislativas.
O texto destaca, principalmente, os grandes temas abordados durante o evento em mesas redondas que reuniram alguns dos principais especialistas e autoridades do país. Estes grandes temas foram: Geologia e Segurança; Retomada do Setor de Óleo e Gás; Defesa das Instituições Públicas de Geologia e da Ciência Brasileira; e Geologia, Mineração e os Desastres Ambientais.
Meio Ambiente – Com relação aos desastres ambientais registrados na mineração, com destaque para a tragédia ocorrida em novembro de 2015 em Mariana (MG), o documento cobra o aprimoramento dos sistemas de monitoramento e fiscalização das 787 barragens de mineração registradas pela recém-criada Agência Nacional de Mineração – ANM, visando garantir a segurança dos trabalhadores e das comunidades em sua área de influência, reduzindo ao máximo a possibilidade de novas ocorrências.
Neste sentido, recomenda ainda a estruturação adequada da ANM, com a realização de concurso público para renovação dos seus quadros, bem como a indicação de profissionais capacitados para compor seu corpo diretivo, repudiando qualquer aparelhamento político na ANM. Também solicita que sempre sejam ouvidas as comunidades atingidas pelos acidentes, em todo o processo de recuperação e/ou restauração das áreas afetadas, garantindo voz e voto nas decisões que lhes afetem.
Indústria de óleo e gás – Em relação à indústria de petróleo e gás no país, um dos principais mercados de trabalho para geólogos e geocientistas, uma das principais recomendações é que se ampliem os debates sobre a política para aproveitamento das reservas de óleo e gás no pré-sal brasileiro, “reconhecendo a diversidade conflitante de cenários quanto à representatividade dos hidrocarbonetos na matriz energética nas próximas décadas”.
Neste sentido, o documento recomenda que seja melhor discutido o conceito de aceleração do aproveitamento das reservas do pré-sal, enquanto ainda valiosas – conforme defendido pelo diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Décio Oddone, em palestra magna durante o evento -, em contraposição ao conceito de que estas reservas devem ser preservadas para atender à contínua demanda por hidrocarbonetos, que ainda permanecerá por muitas décadas na matriz energética mundial – como destacou o ex-diretor da Petrobras, Guilherme Estrella, também em palestra no evento.
Com relação às políticas de petróleo e gás no país, o documento reconhece que o Brasil dispõe de uma das mais eficientes matrizes energéticas do planeta e que as reservas do pré-sal devem, prioritariamente, atender às necessidades de redução das desigualdades sociais no país, como forte instrumento de desenvolvimento. A Carta lembra que “diversos países detentores das maiores reservas de óleo e gás, à exceção da Noruega, não conseguiram garantir a melhoria de qualidade de vida de sua população e que o Brasil não deve e não pode repetir estes equívocos”.
Ainda com relação à indústria de petróleo e gás, o documento pede que seja reconhecido e reverenciado “o talento dos profissionais da Petrobras e o investimento da empresa que levaram à descoberta do pré-sal e ao desenvolvimento da tecnologia de exploração em águas profundas e ultraprofundas, que viabilizaram sua transformação em riqueza”.
Participações especiais – Os geocientistas pedem que sejam revistas pela ANP as regras de utilização dos recursos oriundos das Participações Especiais, em benefício da Ciência, Tecnologia e Inovação, incluindo o apoio a museus e eventos científicos, ajudando, com isso, a ampliar a divulgação da Ciência para a sociedade.
A Carta também manifesta apoio ao projeto da ANP para revitalização e ampliação do Museu de Ciências da Terra, na Urca, Zona Sul do Rio, incluindo a criação do Museu do Petróleo; do Centro de Referência em Geociências e da Rede de Litotecas, para armazenamento dos testemunhos da exploração petrolífera no Brasil. O projeto, que conta com a parceria da Petrobras e do Ministério das Minas e Energia, foi apresentado por Décio Oddone durante sua palestra no evento.
Revisão dos cortes na pesquisa científica – Ainda com relação à ciência, o documento recomenda fortemente que seja revisto o Projeto de Emenda Constitucional – PEC 95, “excluindo a Ciência, Tecnologia e Inovação das restrições orçamentárias e possibilitando a garantia dos recursos necessários ao desenvolvimento de CT&I e afastando o nefasto fantasma do desprestígio à Pesquisa e Desenvolvimento, o desestímulo dos pesquisadores e a evasão de talentos”.
O documento ainda pede à Sociedade Brasileira de Geologia (SBG) que também apoie a Carta de Pernambuco (http://portal.sbpcnet.org.br/noticias/carta-de-pernambuco-politicas-publicas-para-o-brasil-que-queremos/), na qual a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) apresenta uma agenda mínima de debates para proposição de uma Política Pública de CT&I a ser entregue aos candidatos à Presidência da República. Por fim, enfatiza que “ciência não é gasto, é investimento” e recomendar à SBG que inclua este lema em seus documentos físicos e virtuais, expressando sua preocupação com o quadro atual e a necessidade de sua reversão.
O documento manifesta ainda apoio à luta do Museu Nacional por mais recursos para sua restauração e revitalização, no momento em que completa 200 anos de sua criação. E decide apoiar a moção do MN quanto à expansão patrimonial para consolidação e revitalização da primeira Instituição científica do Brasil. Para isso, deve ser incorporado ao seu patrimônio um terreno na Quinta da Boa Vista, de propriedade da União (veja carta específica).
Segurança e participação feminina – A Carta do Rio estabelece ainda proposições em relação à melhoria dos índices de segurança nos trabalhos de campo dos geólogos e geocientistas, seja na academia, seja na vida profissional, com esforços para promover a cultura da segurança e práticas que visem ao bem-estar dos estudantes e colaboradores. Também apoia a constituição da Associação Brasileira das Mulheres nas Geociências, criada durante o 49CBG, como “expressão do respeito à equidade de gênero, congregando e promovendo a integração de mulheres que atuem na área de Geociências no Brasil”,
A Comissão Organizadora do Congresso pede ainda que sejam mantidas e ampliadas as discussões de Grandes Temas nacionais em seus eventos regionais e nacionais, em especial os Congressos Brasileiros, visando à ampliação do debate e proposição de agendas positivas para enfrentamento dos assuntos de interesse dos Geocientistas e da Sociedade Brasileira. Entre estes grandes temas,, estão aqueles abordados no 49o Congresso Brasileiro de Geologia, como Geologia e Segurança; Retomada do Setor de Óleo e Gás; Defesa das Instituições Públicas de Geologia e da Ciência Brasileira; e Geologia, Mineração e Meio Ambiente.
Sobre o Congresso:
Com tema central: “Geologia: Conhecer o Passado para Construir o Futuro “o 49º Congresso Brasileiro de Geologia foi realizado pela Sociedade Brasileira de Geologia (SBG) no Rio de Janeiro, de 20 a 24 de agosto. Homenageando o professor Setembrino Petri, um ícone da Geologia e Paleontologia, como presidente de Honra, reuniu mais de três mil geólogos e geocientistas, 60% deles estudantes.
As atividades começaram na Quinta da Boa Vista, homenageando os 200 Anos do Museu Nacional, e se espalharam pela Cidade: o Museu do Amanhã, no Pier Mauá, discutiu o Antropoceno; o Museu da Geodiversidade, na Ilha do Fundão, recebeu estudantes da rede pública para conhecer um pouco de Geologia e o Museu das Ciências da Terra, na Urca, abriu as portas para os congressistas.
“O Congresso apresentou as últimas conquistas, em nosso país, das diversas disciplinas que englobam a ciência geológica, mas em paralelo, discutiu pontos relevantes do papel da Geologia na sociedade”, disse o presidente da Comissão Organizadora, Hernani Chaves, presidente da SBG-Núcleo RJ-ES. Além dos Grandes Temas, foram ampliados os momentos de discussão nas Sessões Técnicas, com mesas e palestras temáticas, além de proporcionar oportunidade para a criação da Associação Brasileira das Mulheres nas Geociências. “Resumindo: o Congresso foi um grande sucesso”, completou Chaves.
Confira a Carta do Rio de Janeiro na íntegra