Afinal, a legislação mineral brasileira é boa ou ruim? Não há uma resposta única, simples. Muitos afirmam que o melhor regime jurídico é aquele que é estável, o que é parte da verdade. Entretanto, também é consenso que o regime jurídico da mineração brasileira pode ser melhorado.
Necessidade de uma política mineral de Estado para o Brasil
Partindo do ideal para o possível, é necessário entender que as coisas de Estado partem de uma vontade política e que esta é resultado de diversos fatores históricos, sociais e econômicos.
Apenas para nos atermos a um período recente, é certo que não houve política mineral para o Brasil a partir de 1988.
Alguns poderiam argumentar que o Decreto nº 11.108/2022 (alterado pelo Decreto nº 14.419 de 2023) instituiu a política mineral brasileira. Não é verdade, porque se trata de mais um daqueles regulamentos inefetivos. Quem conhece o Brasil percebe, imediatamente, o tamanho do delírio ali contido. Tanto assim é, que não surtiu o mínimo efeito.
A consequência mais visível da falta de política mineral — e que gera diversas outras consequências negativas em cadeia — é não dar estrutura adequada para a Agência Nacional de Mineração — ANM cumprir suas competências institucionais. A Agência segue adiante à custa de esforços individuais.
Nessa sequência de consequências negativas está o descumprimento do comando do art. 37 da Constituição que determina a eficiência administrativa na administração pública.
É bem possível que o Brasil já tenha atingido o que é conhecido como Estado de Coisas Inconstitucional: os comandos constitucionais são reiteradamente descumpridos, as promessas constitucionais são esquecidas e fica por isso mesmo.
Já que estamos falando em eficiência da administração pública, lembro-me bem de situação que vivi em Moçambique (país maravilhoso de gente maravilhosa) quando ministrei aulas de Direito da Mineração para a equipe do Ministério dos Recursos Minerais e Energia, em 2006. A senhora que ocupava o maior cargo no órgão gestor da mineração local estava muito preocupada porque havia um prazo a cumprir no dia seguinte. Ingenuamente, acostumado com a burocracia e a ineficiência administrativa do Brasil, perguntei: — E se você não cumprir? Ela me olhou, não entendendo a pergunta. Não satisfeito, perguntei novamente: — E se você não cumprir? Ela me respondeu, séria: — A empresa cumpriu o prazo dela. Temos que cumprir o nosso. Me remexi na cadeira e fiquei calado.
O reconhecimento mineral antes da fase da autorização de pesquisa
A introdução da fase de reconhecimento geológico terrestre (não o reconhecimento aéreo, que já existe) seria muito interessante, porque poderia eliminar, de antemão, diversos requerimentos de pesquisa.
Entretanto, tal não é consenso. No Canadá, por exemplo, nem todas as Províncias adotam o Reconnaissance. Algumas têm o ato administrativo denominado prospector’s licence. Em outras, há apenas exigência de se fazer o registro como prospector e pagar os emolumentos, mas não há emissão de um ato administrativo de consentimento.
Para o Brasil, penso ser necessária a outorga de um direito de reconhecimento terrestre diante da possível resistência do proprietário ou possuidor do imóvel. Com o direito formal de reconhecimento, o minerador poderá se valer das servidões minerais para superar a resistência do proprietário ou possuidor.
O Código de Mineração da Nova Zelândia contém sistema muito melhor, que também poderia ser examinado para o Brasil: para atividades de utilidade pública — como a mineração —, que não causem dano à propriedade (levantamento de dados para estudos ambientais, coleta de dados e amostras, medições da qualidade da água etc.), há procedimento simplificado: basta notificar o proprietário e, sem qualquer outra burocracia, realizar a atividade, conforme art. 49 do Crowns Minerals Act.
Alteração do regime de autorização – concessão
Entre os modelos existentes, o adotado no Peru (com algumas modificações) me parece o mais interessante: uma única concessão para pesquisa e lavra, que englobaria todas as atividades e etapas da mineração.
Esse tipo de procedimento encurtaria o tempo necessário à outorga da concessão de lavra para meses e evitaria o duplo trabalho de elaborar (e da ANM analisar) primeiro um relatório Final de Pesquisa e, depois, o Requerimento de Lavra. Todas as informações da pesquisa e do Plano de Aproveitamento Econômico poderiam ser apresentadas numa única oportunidade.
A Licença Mineral – Lei 6.567/78
Outra questão que vem me chamando a atenção é o atual sistema de aquisição da prioridade nos Licenciamentos Minerais da Lei 6.567 de 1978. É hora de debater a alteração desse sistema, adotando o procedimento geral: marcação da prioridade no ato do requerimento perante a ANM e a outorga pela Agência.
Há muitas outras possibilidades de aprimoramento da legislação mineral, que trataremos futuramente nesta coluna.
A verdade é que, no Brasil, é melhor viver com o que já é conhecido (mesmo ruim) do que se aventurar com o desconhecido. Submeter qualquer coisa ao Poder Legislativo atualmente é correr o risco de receber algo pior, mais os tradicionais jabutis.