Como diz o incomparável Caetano Veloso, “só é possível filosofar em alemão”. Não que eu vá filosofar aqui nestas parcas linhas. Mas peço licença para usar a palavra “Zeitgeist”, que significa “Espírito do Tempo” em bom alemão.
Pois bem. O espírito do nosso tempo, como todos bem sabem, é o de disseminar o que se julga serem fatos ou notícias, mas não são. Começaram a chamá-los de fake News. Em bom português são mentiras deslavadas. Já as ouvi e li de todos os tipos, com os mais diversos temas e vindas das “fontes” mais inesperadas e, por isso mesmo, menos confiáveis. Sobre mineração, setor que acompanho com atenção, ouvi bem poucas. Até o final de novembro. Mais exatamente 26 de novembro.
Foi quando veio a público a venda, pelo grupo peruano Minsur, da Mineração Taboca, maior produtora de estanho do Brasil, que opera a Mina de Pitinga, em Presidente Figueiredo, no Amazonas, de onde também extrai tântalo e nióbio, para a China Nonferrous Mining Metal Company, uma das maiores produtoras de cobre do mundo, além de cobalto. Foi o quanto bastou para que, feito rastilho de pólvora, se alastrasse a denúncia da venda da “maior reserva de urânio do país aos chineses”, acordo que teria sido fechado pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva durante a visita, poucos dias antes, de Xi Jinping, presidente da República Popular da China, ao Brasil.
Não foi a criação ardilosa da mentira, tampouco sua proliferação viral, que me espantou. Isso é natural em sites e blogs de quinta categoria, dirigidos por influencers de categoria nenhuma, que se proclamam jornalistas. Tampouco me espantou que o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) e o senador Plínio Valério (PSDB-AM) subissem às suas respectivas tribunas para clamar contra a venda de riquezas brasileiras, aliás, de uma reserva estratégica como é a de urânio, aos chineses. Esse comportamento também tem sido próprio e típico, há já alguns anos, da maioria de nossos nobres parlamentares.
Espanto mesmo foi quando passei a ver a reprodução da mentira em portais jornalísticos (agora, já não acho tanto), como Terra e G1, este último do poderoso conglomerado Globo, ambos com um time continental de produtores para a checagem de dados antes que qualquer notícia adube os campos férteis das plataformas digitais e redes sociais. Até escrevi a colegas do G1, alertando sobre a irresponsabilidade e enviando a nota divulgada pela INB (Indústrias Nucleares do Brasil), desmentindo o inverídico fato, por assim dizer. Medo de, em breve, ver patriotas de verde e amarelo – ou só de verde oliva -, portando bandeiras e bíblias, a vociferar em defesa da soberania nacional. Felizmente, não aconteceu.
Esse é o nosso zeitgeist, o nosso espírito do tempo. O meu espírito do tempo já era bem outro então. De luzes, árvore enfeitada e presépio. Passado o susto, resta o aprendizado. Nem a mineração, sempre ignorada pela sociedade e redes sociais, escapou ilesa. Nem o jornalismo profissional. Voltando ao espírito que acredito que este tempo deva ter, desejo a todos um Natal de paz e união e um novo ano de conquistas. Que nesses próximos dias, a única fake News aceitável seja a de que Papai Noel existe. Obrigada pelo apoio em todo 2024 e Boas Festas!
Saudações natalinas,
Tébis Oliveira, editora executiva