A IMPORTÂNCIA DOS STAKEHOLDERS NO SETOR MINERAL

A IMPORTÂNCIA DOS STAKEHOLDERS NO SETOR MINERAL

mathiasPor Mathias Heider1

Introdução

 Na mineração existe um consenso no sentido de que o mais complicado na abertura de uma nova mina não é extrair a matéria-prima, mas sim gerenciar o complexo relacionamento com as comunidades que vivem ao seu redor, bem como com os demais agentes associados ao setor mineral, denominados “stakeholders”. Os stakeholders ainda são pouco estudados de forma criteriosa pelas empresas mineradoras e muitos acabam passando despercebidos, não sendo tratados com a devida importância. Assim, torna-se imperioso entender os grupos, pessoas e entidades que influenciam a empresa de alguma forma, objetivando mitigar seus efeitos negativos e potencializar os efeitos positivos.

Os inúmeros stakeholders identificados e relacionados ao setor mineral (vide Quadro 01) e a compreensão de seus impactos, demonstram que a sua complexidade é cada vez mais crescente e ainda desconhecida. São agentes capazes de suspender uma pesquisa mineral, atrasar um projeto e paralisar  operações de tal forma que podem inviabilizar a atividade mineral. Nesse contexto, o antigo conceito onde o valor de uma mina baseava-se em três variáveis (na reserva de minério no solo, no custo de sua extração e no preço mundial do minério) torna se cada vez mais obsoleto.    

Primeiramente, é preciso mudar a mentalidade da empresa, de modo que toda organização entenda a importância dos stakeholders e seus respectivos impactos. Em segundo lugar, deve-se obter os dados necessários para deixar claro quem são os stakeholders, seu grau de importância, o que desejam e quem está interligado a quem. Em terceiro lugar, é preciso descobrir uma maneira de relacionar os dados com o desempenho operacional, integrando as informações aos sistemas de gestão de risco e ao planejamento estratégico. Em quarto lugar, interagir com os stakeholders da comunidade de maneira genuína e imparcial, ouvir suas preocupações e formar conexões, em vez de simplesmente assinar um cheque. Por fim, deve-se descobrir um meio de disseminar informações sobre o andamento do projeto que sejam confiáveis e transparentes.

A atividade mineradora provoca uma série de conflitos por seus impactos e ameaças socioambientais e territoriais (além dos riscos associados), mobilizando os agentes (Stakeholders) direta e indiretamente impactados. A instalação de um grande empreendimento minerário em espaço antes periférico e desprovido de visibilidade torna-se local de interesse regional e nacional, atraindo diversas instituições públicas e privadas. Diante desse contexto de transformações sociais, econômicas e ambientais, os grupos locais tendem a organizar-se ou consolidar-se socialmente ou a atuar de forma associativa, como as prefeituras que formaram entidades como a AMIG (Associação de Municípios Mineradores de Minas Gerais) e a CNM (Confederação Nacional de Municípios), buscando maior representatividade e protagonismo.

Stakeholders

Stakeholder é toda pessoa ou grupo afetado ou que afeta a organização, também chamado de parte interessada (ou ainda, agentes) e que exerce um grau de influência cujos interesses devem ser reconhecidos e avaliados (vide Quadro 01). A Teoria dos Stakeholders afirma que as empresas têm obrigações para com muitas pessoas e grupos que tanto afetam como são afetados pela organização. Eles incluem acionistas, governo, clientes, funcionários e comunidade, entre outros. Assim, a teoria dos stakeholders é um modelo utilizado para o estabelecimento de um diálogo permanente visando a inserção dos interesses das partes no planejamento estratégico da organização. A abordagem gerencial é diferenciada exigindo um equilíbrio entre os interesses dos diversos públicos desde a etapa de pesquisa mineral até o fechamento da mina. O foco da Teoria dos Stakeholders é a democratização das relações entre sociedade, partes interessadas e empresas no lugar do foco nos acionistas.

As estratégias das organizações devem considerar as necessidades dos “stakeholders”, conforme sua legitimidade, do seu grau de importância e de relevância para a empresa. As dimensões utilizadas para classificar esses grupos de interesse são:

  1. a) Poder: detectada a partir do grau de imposição dos stakeholders sobre a organização (possivelmente exercido de forma coercitiva, utilitária ou normativa). Esses grupos de influência utilizam recursos coercitivos contra a empresa como ameaça, força física ou armas; recursos utilitários (informação, tecnologia, matéria prima ou dinheiro, entre outros); e recursos normativos como meios de comunicação ou legislação;
  2. b) Legitimidade: identificada a partir do quanto as ações de um grupo são desejáveis ou são corretas, conforme o ambiente em que está inserido. É o atributo que dá ao stakeholder direitos e deveres de praticar atos aprovados e garantidos pelo sistema social que a empresa opera; e,
  3. c) Urgência: constatada a partir das pressões em relação a tempo, ou seja, quão rápida necessita ser a resposta da empresa em relação às demandas. A criticalidade, por sua vez, diz respeito a quão importante é a exigência feita e a necessidade de relacionamento entre eles.

A partir das dimensões de poder, legitimidade e urgência, os stakeholders se classificam em sete grupos que compõem o modelo denominado “Stakeholder Salience”:

1) Adormecido: tem poder sobre as organizações, mas não tem as dimensões de urgência e legitimidade. Por isso, este grupo, de certa forma, não recebe atenção das organizações;

2) Discricionário: influência por legitimidade, porém não existe poder, nem a exigência de urgência sobre a organização; nessa situação, é comum dar atenção ao stakeholder por meio de ações sociais na empresa;

3) Exigente: exerce urgência sobre as organizações, porém tem baixa influência porque não tem legitimidade e poder;

4) Dominante: induz por legitimidade e com poder sobre a organização; esses são alvos e ao mesmo tempo expectadores da atenção das organizações;

5) Perigoso: implica em risco para a organização, pois exerce poder e urgência e pode ser coercitivo ou violento, visto que não há legitimidade; esse grupo deve receber ampla atenção dos gestores;

6) Dependente: apesar de provocar urgência e legitimidade sobre a organização, depende de outro stakeholder que exerça poder para que suas exigências sejam atendidas; e,

7) Definitivo: dentre os sete grupos citados, este é o que mais recebe atenção imediata das organizações já que possui os três atributos e, consequentemente, tem um grau de exigência superior aos demais.

Na figura abaixo, temos a avaliação do nível de engajamento (desde bloqueadores até os apoiadores e aliados) dos stakeholders, que pode ser revertido a partir de uma gestão adequada:

engajamento de stakeholders

 

Figura 1: Nível  de engajamento dos stakeholders

Fonte: PMBOOK

 

O Quadro abaixo tem como objetivo listar os stakeholders identificados no setor mineral, desde a etapa de pesquisa mineral até o fechamento do empreendimento:

 

listagem dos stakeholders

Quadro 01: Listagem dos stakeholders do setor mineral

Fonte: Várias, ajustado por Heider

 

Benefícios da gestão dos Stakeholders

Os benefícios da gestão dos stakeholdres são numerosos: obter o apoio social necessário para conduzir um projeto; aumentar a vantagem competitiva; atrair e reter funcionários, clientes, investidores, doadores, membros; e garantir financiamento com base em princípios socialmente responsáveis, etc.

Os investidores e outras partes interessadas costumam perceber a falta de transparência como uma ameaça não apenas ao bem-estar ambiental e social, mas também à lucratividade do investimento. Isso pode resultar em instabilidade social e política na forma de protestos da comunidade, ativismo ambiental e social, disputas entre acionistas e deterioração do clima organizacional entre os funcionários devido a questões ambientais, sociais, de saúde e segurança. O desenvolvimento de relacionamentos positivos e cooperativos com as partes interessadas aumenta a probabilidade de um projeto prosseguir dentro do orçamento e no prazo.

A identificação do Potencial de Ameaças ou Colaboração associado a cada stakeholder permite construir parcerias e convergência, desenvolver ações, identificar interesses e traçar estratégias específicas com a criação de valor mútuo. Tem um forte impacto na licença social e desenvolvimento de novos modelos de interação com Visão Multidimensional e diálogo permanente. A avaliação dos principais stakeholders também é considerada na “Análise de Impacto Regulatório” (AIR), aperfeiçoando o processo regulatório e auxiliando na busca das melhores soluções para o setor regulado.

Podemos citar outros benefícios:

  • Impactos positivos nas comunidades (apoio ao empreendedorismo local e redução dos conflitos);
  • menor risco do projeto;
  • melhoria do clima organizacional;
  • redução de conflitos com grupos de stakeholders (comunidade, grupos impactados etc.);
  • redução dos impactos sociais negativos e ambientais;
  • imagem da empresa e do setor;
  • melhoria da avaliação da viabilidade do projeto;
  • dinamização das economias locais e regionais e
  • suporte para a Licença Social de Operação da empresa perante a comunidade.

Conclusão

Estudos realizados demonstram que várias mineradoras já perceberam que a diminuição do número de conflitos com os stakeholders externos e a conquista do seu apoio melhoram as chances da empresa de alavancar seu plano de negócios dentro do orçamento e do prazo previstos produzindo, dessa forma, valor sustentável para o acionista, além de reduzir os riscos do projeto.

Portanto, existe a necessidade de delineamento de estratégias de ação de curto prazo (no período em que a mineração atua na comunidade) conjugadas com as de longo prazo (que perduram além do tempo de vida da mineração), visando contribuir para a sustentabilidade socioeconômica da operação mineira.

Demandas complexas como municípios impactados, segurança de barragens, reaproveitamento de resíduos, licença social para operar, fechamento de mina, gestão territorial e uso futuro de área de mineração exigirão cada vez mais um diálogo com os diversos stakeholders visando construir soluções em conjunto, buscando convergências e redução dos conflitos. Existem conceitos que, a exemplo da sustentabilidade, consideram as gerações futuras como um stakeholder do setor mineral.

(1) Mathias Heider é engenheiro de Minas da Agência Nacional de Mineração (DNPM) em Brasília (Sede) 

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